A Zona Franca de Manaus completa 54 anos. Há exatos 54 anos atrás nascia o modelo com o objetivo de alavancar a economia de uma região situada no coração da Floresta Amazônica. De lá para cá muita coisa mudou. O mundo também. Mas parece que o tempo parou por aqui. Parece que ainda vivemos nos idos de 1970 em que a febre “Zona Franca de Manaus” tomava conta do País. 

Sim. Os ganhos foram incontáveis nesses 54 anos. Disso não resta dúvida nenhuma. A grande questão é: e quanto ao nosso futuro? Estamos realmente preocupados com ele? O que estamos fazendo no presente para termos uma matriz econômica alternativa? Eu respondo: NADA. Eis o nosso grande calcanhar de aquiles.

A economia global vem sofrendo grandes rupturas. Rupturas que irão mexer (ou já estão mexendo) com a vida de todos nós. Existem novas demandas que estão impulsionando novas formas de fazer negócios nos quatro cantos do planeta. Uma delas é a busca por fontes de energia renováveis. Dentro desse escopo, máquinas com soluções elétricas  despontam em vários países. Os motores elétricos são uma realidade há muito tempo. Mas só num período relativamente recente é que eles entraram na pauta da indústria dos transportes. Aqui, a Índia desponta como um grande mercado.

Em setembro de 2018 o país pretendia que até 2023 15% de sua frota de veículos fosse movida a eletricidade. No ano passado a fabricante indiana NorthwayMotorsports transformou seu modelo de veículo popular – Maruti 800 – num veículo elétrico. Em 2020 também a Hyundai anunciou a produção do SUV Compacto para a Índia. A promessa é que para 2022 o veículo seja totalmente elétrico. Mas não é apenas o setor de transportes que está sentindo essa demanda. Também o polo de 2 rodas vem sendo visitado cada vez com mais frequência por ela (bicicletas e motocicletas).

Mas talvez a mudança mais significativa e que promete impactar  a indústria eletroeletrônica – entenda-se, Zona Franca de Manaus – refere-se à produção de televisores.

Há vários anos os telefones móveis deixaram de ser apenas ferramentas de comunicação pessoal. Transformaram-se em smarts fones. Por meio da internet das coisas eles conseguem se conectar a vários outros dispositivos (estações de rádio e TV, dentre outros). Pois bem. Os televisores, na forma como atualmente os concebemos, tendem a desaparecer. Migrarão para dentro dos aparelhos celulares. Aliás, isso já é uma realidade em muitos países do mundo. Seu uso em massa, contudo, é apenas uma questão de tempo.

Conforme se vê, não temos muita margem de escolha. A produção em grande escala de motores elétricos em outras partes do mundo;  e  a  demanda cada vez mais frequente por televisores em telefones celulares são dois grandes problemas que ameaçam diretamente duas das mais importantes colunas da Zona Franca de Manaus. Evidentemente que nenhum deles poderá ser resolvido com emendas constitucionais, esticando o prazo de validade do modelo. Também não há como pressionar o Ministro da Fazenda do Brasil mediante discursos inflamados, buscando uma solução. É preciso que tenhamos consciência que  a solução vem de fora do País e, na verdade, não temos controle nenhum sobre ela. Justamente porque a solução depende exclusivamente das leis de mercado, muito mais poderosas e destrutivas (em alguns casos) que as leis jurídicas.

Uma das críticas que se levanta contra o modelo Zona Franca de Manaus é que ele se tornou e está se tornando cada vez mais obsoleto. Além de estar sustentada por soluções que daqui a pouco deixarão de existir, o modelo bem que poderia ser repensado imediatamente, a fim de  incorporar funcionalidades que poderiam lhe dar mais sustentabilidade. Como? Transformando-a numa zona de produção e desenvolvimento de inovações tecnológicas, à maneira da Zona Franca chinesa Shenzhen.

Em 1980 – dois anos após seu nascimento – a Shenzhen transformara-se numa zona de atração de novas tecnologias. A coisa deu tão certo que sua população cresceu de 30 mil habitantes para 12 milhões de pessoas em 2018. Seu PIB em 2018 bateu US$ 491 bilhões de dólares, o quarto maior PIB da China. Seus investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos representam o dobro da média nacional chinesa. Taí uma ótima alternativa para a nossa Zona Franca.

As mudanças na economia são como ondas. Elas nascem em algum ponto do planeta e, rapidamente, se propagam em várias direções. Muito semelhante à pandemia no mundo. Dependendo da região onde essas ondas irão “quebrar”, sua força pode ser descomunal, à maneira de uma grande tsunami. Muitas tsunamis estão nascendo ao redor do planeta e ainda não nos damos conta disso. Insistimos em tentar manter a vida de um paciente numa UTI a peso de remédios (jurídicos), enquanto o corpo já não dá mais sinais de sobrevida. Por isso é tão importante a busca por alternativas. Aliás, já se passaram 54 anos e ainda não nos despertamos para isso. Continuamos a viver berço esplêndido.

Precisamos mudar rapidamente. Pensar nosso futuro. Observar as grandes tsunamis que estão se formando ao nosso redor e bater o martelo.

Do contrário, seremos submergidos por todas elas e voltaremosinevitavelmente  a ser  apenas um grande porto de lenha…

Alipio Reis Firmo Filho

Conselheiro Substituto – TCE/AM e Doutorando em Gestão

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