O direito à terra, à autodeterminação e ao trabalho foram abordados por lideranças indígenas na última sexta-feira (24/6), durante o 1º Seminário Regional sobre o Trabalho Indígena no Amazonas e Roraima, promovido pela Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região – AM/RR (Ejud11). O município de Presidente Figueiredo, localizado a 126 km da capital do Amazonas, sediou o evento, que contou com relatos de representantes indígenas das etnias Baré, Witôto e Munduruku sobre os desafios enfrentados nos espaços acadêmicos, no mercado de trabalho e na luta pelo direito de existir. 

Com transmissão ao vivo pelo canal da Ejud11 no YouTube, o seminário pode ser assistido em qualquer tempo. A realização foi iniciativa da Ejud11 em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e com a Associação dos Magistrados do Trabalho da 11ª Região (Amatra XI). O evento também fez parte do programa de intercâmbio dos magistrados do TRT da 12ª Região (SC).

O diretor da Ejud11, desembargador Audaliphal da Silva, foi contundente ao abrir o evento pedindo respeito aos povos indígenas. “Devemos muito a eles, pois estavam aqui antes de nós”, salientou. Na sequência, o cacique Ismael Gonçalves fez um breve discurso falando sobre a luta incansável dos indígenas para ter os direitos respeitados. “Muito me alegra estar aqui hoje para discutir o direito dos indígenas ao lado de pessoas que tomam decisões e que podem nos ajudar. Temos muito o que conversar. Espero poder contribuir e aprender com vocês”, disse. 

Palestras

Ministrada pelo Doutor em Direito Socioambiental Edson Damas da Silveira, a primeira conferência teve como tema “O direito à terra e ao trabalho dos povos indígenas de Roraima”. Procurador de Justiça do Ministério Público de Roraima (MP/RR),  o palestrante falou sobre o reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, abordando a Organização Internacional do Trabalho (OIT), e a Resolução 287 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que versa sobre a forma adequada de tratamento oferecido aos indígenas acusados em processos criminais. 

Logo após, houve a palestra do procurador federal Bianor Saraiva Nogueira Júnior (Procuradoria Geral Federal/AGU), sobre “O direito à autodeterminação e as relações de trabalho’’. Ele destacou a forma equivocada com que os índios são vistos e com o que é propagado pela mídia. “Dizem que índio que toma coca cola e usa celular não é mais índio. Isto é um absurdo! Querem diminuir e acabar com os direitos dos poucos índios que ainda existem no Brasil. A sociedade deve conhecer, se envolver e se juntar na luta pela garantia dos direitos dos povos indígenas”, declarou. 

O direito de existir e os desafios enfrentados 

A fala de quatro representantes indígenas foi o ponto alto do evento. Pela etnia Baré, Sediel Andrade Ambrósio falou sobre os desafios da ocupação indígena nos espaços acadêmicos em busca da qualificação profissional. Oriundo de São Gabriel da Cachoeira, ele é enfermeiro e está cursando Mestrado em Saúde na Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Também da etnia Baré, a estudante do 7º período do curso de Direito da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Luzineide Andrade dos Santos relatou sobre as dificuldades encontradas no mercado de trabalho. Ismael Franklin Gonçalves, da etnia Munduruku,  abordou as dificuldades enfrentadas pelos estudantes que migram para Manaus. Ele é o cacique do Parque das Tribos, bairro localizado na zona oeste de Manaus, onde 35 etnias indígenas convivem no mesmo local, mais de 2 mil indígenas e 17 diferentes idiomas falados. 

Pela etnia Witôto, Vanda Ortega falou sobre a luta pela existência dos povos indígenas. A técnica de enfermagem foi a primeira pessoa vacinada contra a covid-19 no Amazonas, em janeiro de 2021. Hoje ela cursa pedagogia na UEA e defende que a melhor ferramenta na luta pelos direitos dos índios é a educação. Para ela, ir à escola, ter preservado o direito de aprender a ler e escrever dá aos povos indígenas a oportunidade de lutar pelo direito de existir e de cuidar deles mesmos. “Infelizmente ainda vemos um apagamento da história e da cultura dos povos indígenas no Brasil. Não temos voz e precisamos ser ouvidos. Deveríamos estar em todos os espaços de discussão. Nós lutamos diariamente pelo direito de existir”, declarou. 

O Seminário foi encerrado com a palestra do juiz do trabalho Sandro Nahmias Melo, titular da Vara do Trabalho de Presidente Figueiredo e doutor em Direito. Ele abordou o tema ‘’O direito de acesso à Justiça e Justiça Itinerante na 11ª Região”. Destacando o ineditismo do evento, pela temática nunca antes discutida por nenhum Tribunal do Trabalho, o magistrado ressaltou o trabalho da Ejud11 na realização do evento para discutir os direitos dos povos indígenas. 

Autoridades 

O seminário contou com a presença das desembargadoras do trabalho Márcia Nunes da Silva Bessa, corregedora regional, e Joicilene Jeronimo Portela; juiz do trabalho Adelson Silva dos Santos, presidente da Amatra XI; juiz do trabalho Rodrigo Goldschmidt, vice-diretor da Ejud12; juiz do trabalho Luis Fernando de Carvalho, coordenador pedagógico da Ejud12; juíza do trabalho Carolina França, vice-diretora e coordenadora pedagógica da Ejud11; dos juízes do trabalho Alexandro Alves e João de Almeida Neto, entre outras autoridades.  

Também estiveram presentes os representantes indígenas: Leanderson Ortega e Anderlecia Barroso, pela etnia Witôto; Ariene dos Santos Lima, pela etnia Wapichana; e Pedro Catanhede Cabral. O evento registrou a presença de servidores do TRT-11, funcionários da prefeitura de Figueiredo, estudantes e comunidade em geral. 

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