
Vivendo sob rigoroso sigilo e discrição, mais de 500 pessoas atualmente integram o Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (Provita), coordenado pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Criado em 1999, o programa oferece segurança e suporte integral a indivíduos que enfrentam ameaças graves em razão de sua colaboração com investigações ou processos criminais.
Recentemente, a história de uma das protegidas ganhou destaque nacional ao inspirar o filme Vitória, estrelado por Fernanda Montenegro. O longa é baseado na trajetória de Joana da Paz, uma idosa de 80 anos que decidiu denunciar o tráfico de drogas em frente à sua residência, na Ladeira dos Tabajaras, em Copacabana, Rio de Janeiro. Munida apenas de uma câmera simples, Joana documentou a movimentação criminosa, o que resultou na prisão de mais de 30 pessoas, entre traficantes e policiais envolvidos. Após sua denúncia, Joana ingressou no Provita e viveu sob proteção até falecer, em 2023, aos 97 anos, em Salvador (BA).
Assim como Joana, centenas de outras pessoas passaram pelo programa. Segundo dados atualizados até dezembro de 2024, o Provita atende atualmente 170 casos ativos, envolvendo cerca de 510 indivíduos — incluindo vítimas, testemunhas e réus colaboradores não encarcerados. A proteção pode ser estendida a familiares diretos, como cônjuges, filhos e pais.
Como funciona o Provita
A solicitação de entrada no programa pode ser feita pelo próprio interessado ou por intermédio de juízes, promotores, delegados ou organizações de defesa dos direitos humanos. Após a solicitação, uma equipe multidisciplinar avalia o risco e a relevância da colaboração para a Justiça.
Se comprovada a gravidade da ameaça, o caso é submetido a um Conselho Deliberativo, composto por representantes do Ministério Público, do Judiciário e de outras instituições. Se aprovado, o protegido e seus familiares são transferidos para outro estado, onde passam a viver em endereço sigiloso, com rotinas discretas e controle rigoroso de informações.
As moradias são comuns, sem identificação externa, e geralmente mudadas a cada nove meses para preservar a segurança. Além do novo lar, os protegidos recebem apoio psicológico, jurídico e social. Em alguns casos, também há auxílio financeiro: conforme a Portaria nº 659/2023, uma família de quatro pessoas pode receber até R$ 3.202,04 mensais para custear a nova vida.
Rotina de cuidados e sigilo
A vida sob o Provita exige a adoção de medidas rigorosas. Contatos com conhecidos do passado são permitidos apenas em casos excepcionais e previamente autorizados. Trabalhar com registro em carteira também é desaconselhado, pois pode expor a localização da pessoa.
Um servidor da Secretaria de Segurança Pública de Goiás, que atua na execução do programa e preferiu não se identificar, relatou ao Metrópoles que criminosos já tentaram acessar bases de dados públicas para localizar testemunhas protegidas. “Tem advogado de facção que consegue acessar o sistema do Ministério do Trabalho e descobre onde a pessoa está empregada”, alertou.
Para garantir o sigilo, algumas realocações são feitas com os olhos vendados, de modo que nem os protegidos saibam para onde estão sendo levados. Toda a documentação pessoal — como registros escolares, históricos médicos e documentos civis — é cuidadosamente reestruturada para garantir a preservação da nova identidade.
Os profissionais que atuam no programa seguem protocolos rígidos de confidencialidade. “Retiramos a pessoa e fazemos toda a mudança sem que vizinhos ou conhecidos saibam que se trata de um abrigo”, explicou o mesmo servidor.
O sucesso da proteção, contudo, também depende da disciplina dos próprios beneficiários. O descumprimento das regras de sigilo — como tentativas de retomar contatos antigos ou exposição de informações sensíveis — pode levar à exclusão do programa. Em casos de risco elevado, novas transferências e mudanças de identidade podem ser realizadas para manter a integridade da proteção.
Com informações de Metrópoles