O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, sob escrutínio há uma semana por declarar lei marcial pela primeira vez em décadas no país asiático, deu uma ordem para retirar deputados da Assembleia Nacional à força durante o breve período em que o decreto vigorou, disse um comandante do Exército nesta terça-feira (10).
“Ele disse para arrombar a porta, entrar lá e arrastar as pessoas de dentro”, disse a um comitê parlamentar Kwak Jong-geun, do Comando de Guerra Especial do Exército, em referência a uma das várias ligações telefônicas que diz ter recebido de Yoon nas horas seguintes à tentativa de autogolpe.
Kwak afirma que decidiu não executar a ordem de Yoon, embora tropas tenham tentado invadir a Assembleia naquela noite para impedir uma votação que derrubaria a lei marcial e faria o presidente recuar. A investida fez o prédio ser palco de embates entre assessores munidos de extintores de incêndio e militares, uma amostra do caos no qual o país mergulhou após o decreto.
O testemunho do comandante é uma reviravolta na tentativa do país de reconstruir a noite de terça passada (3). Até agora, militares vinham apontando o ex-ministro da Defesa, Kim Yong-hyun, como culpado pela ordem para retirar os parlamentares do plenário. Preso no último domingo (8), Kim renunciou no dia seguinte à lei marcial e assumiu “total responsabilidade pela confusão”.
A admissão de culpa, no entanto, não foi suficiente para livrar Yoon de investigações criminais por acusações de insurreição. O presidente ainda está proibido de sair do país, assim como seus ex-ministros da Defesa e do Interior, dois militares e, desde esta terça, outros três comandantes de alto escalão da polícia, segundo a agência sul-coreana de notícias Yonhap.
O futuro do presidente é incerto. Apesar de ter conseguido sobreviver por pouco a um impeachment no fim de semana, há uma crescente dissidência entre seus correligionários —nesta terça, Kim Sang-wook se tornou o terceiro parlamentar da sigla de Yoon, o PPP (Partido do Poder do Povo) a declarar abertamente apoio à abertura do processo após se opor na primeira votação.
As dissidências podem ser determinantes, já que apenas dois dos 108 deputados do partido disseram ter votado a favor do impeachment na semana passada. O número é insuficiente para a oposição, que precisa de pelo menos oito deputados do PPP para conquistar os dois terços das cadeiras necessários para iniciar a destituição do presidente.
Em uma entrevista coletiva, Kim afirmou que outros membros do partido provavelmente se juntarão a ele. “Acho que há um número suficiente para aprovar o impeachment”, disse, em referência à nova votação marcada para o próximo sábado (14).
Enquanto isso, as lideranças do partido tentam colocar de pé um arranjo no qual manteria Yoon formalmente na Presidência, mas, na prática, retiraria o político de suas funções. A proposta, vista como um segundo golpe pela oposição, adiciona mais uma camada de confusão à política sul-coreana.
A medida foi anunciada no domingo pelo líder do PPP, Han Dong-hoon. Ao lado do primeiro-ministro Han Duck-soo, ele afirmou que o presidente seria excluído de assuntos externos e de outros assuntos de Estado e que o premiê gerenciaria questões do governo.
Segundo a Constituição do país, porém, o presidente é chefe de governo e comandante do Exército a menos que seja incapacitado ou renuncie, caso em que o poder é repassado interinamente ao primeiro-ministro até que novas eleições sejam organizadas.
Questionado pela agência de notícias Reuters sobre quem estava governando a Coreia do Sul, o gabinete de Yoon disse que não tinha “posição oficial a oferecer”, mas mencionou declarações anteriores dos ministérios das Relações Exteriores e da Defesa.
Na segunda (9), o porta-voz do Ministério da Defesa disse que Yoon ainda era o comandante do Exército e que o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores afirmou que os assuntos de Estado, incluindo os assuntos exteriores, “estavam sendo conduzidos sob um processo estabelecido na Constituição e na lei”.
A ideia é que Yoon permaneça no cargo até fevereiro ou março e uma eleição seja realizada em abril ou maio, afirmou nesta terça Lee Yang-soo, líder de uma força-tarefa lançada pelo PPP para planejar a eventual do presidente. “Ainda não chegamos a uma conclusão em todo o partido e teremos outra reunião com todos os nossos membros do Parlamento à tarde para discutir esse plano”, disse Lee a jornalistas.
Com informações da Folha de São Paulo