
O Ministério Fiscal da Espanha, órgão equivalente à Procuradoria-Geral da República (PGR) no Brasil, recomendou a rejeição dos pedidos de prisão e extradição do blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio, feitos pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O pedido do STF diz respeito à investigação sobre a divulgação de dados do delegado da Polícia Federal Fábio Shor, responsável por inquéritos contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, aliados e militantes de direita.
Em contato com o Metrópoles, Oswaldo Eustáquio afirmou que a recomendação deverá encerrar o andamento dos pedidos na Justiça espanhola. No Brasil, a ação acusa Eustáquio de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado.
“O juiz espanhol só julgaria os pedidos se eu fosse acusado. E o órgão acusador não fez denúncia. Mais que isso, ele disse que o que a Justiça brasileira aponta como tentativa de golpe, na Espanha, é visto como liberdade de expressão”, alegou o jornalista.
Na recomendação feita à Justiça espanhola, à qual o Metrópoles teve acesso, a procuradora Tereza Sandoval afirma que, “de acordo com a legislação brasileira, os fatos configuram crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado”. “Na atual legislação espanhola, os fatos não constituiriam crime, uma vez que são protegidos pela liberdade de expressão. Portanto, a dupla incriminação normativa não se aplica”, observou a procuradora.
“Por todas estas razões, não é apropriado concordar com a extradição de Oswaldo Eustáquio Filho solicitada pelas autoridades brasileiras, para acusação de alegados crimes de abolição violenta do Estado democrático brasileiro e de golpe de Estado, por falta da exigência de dupla criminalização”, concluiu Sandoval.
Campanha contra delegado
Oswaldo Eustáquio teve a prisão decretada em agosto de 2024 após a divulgação, no perfil da filha adolescente nas redes sociais, de dados pessoais do delegado federal Fábio Alvarez Shor, que comanda as investigações sobre atos antidemocráticos e é responsável pelo indiciamento de Jair Bolsonaro no caso da venda de presentes dados por chefes de Estado ao ex-presidente.
O pedido feito à Justiça espanhola, assinado pelo juiz auxiliar Rafael Henrique Jalena Tamai Rocha, do gabinete do ministro Alexandre de Moraes no STF, acusa Eustáquio de conduzir uma campanha contra Shor usando o perfil da filha, Mariana, de 16 anos. As publicações tiveram início em julho de 2024, após o indiciamento de Bolsonaro.
“O delegado Fábio Shor, que assina o indiciamento de Bolsonaro, roubou o telefone celular da minha mãe em 2020. Ele é mau e descumpre a lei para alcançar seus objetivos. Acordou meus irmãos às 6h e mexeu na minha gaveta de roupas íntimas, debochando. Deus fará justiça”, diz a primeira publicação.
Na segunda, o perfil de Mariana postou uma foto da esposa do delegado, Tatiana. “A esposa do delegado Fábio Shor esconde o sobrenome no jaleco de dentista e assina Taciana Dib. Meus amigos do Mackenzie Brasília colocaram aparelho com ela, que discordou do marido ter invadido meu quarto, roubado aparelhos e deixado meu irmão com dificuldade de fala. Sigam!”.
A terceira postagem trouxe uma foto do próprio delegado. “Este é o delegado Fábio Alvarez Shor, que por anos conseguiu ficar anônimo, sem fotos na internet. Ele é o responsável por prender patriotas inocentes e fazer milhares de crianças chorarem por seus pais. Ele invadiu meu quarto e indiciou Bolsonaro. Vou orar até acontecer!”.
A partir dessas postagens, perfis de políticos e lideranças de direita passaram a publicar mensagens e incitações contra Shor, como o do senador Marcos do Val, citado no pedido do STF. Um vídeo do filho de Eustáquio, de 10 anos, também foi publicado no perfil de Mariana alegando ser “vítima” de Fábio Shor.
“Urgente: Bernardo Eustáquio, uma das milhares de crianças vítimas do delegado Fábio Alvarez Shor, dá o seu testemunho sobre a crueldade do responsável pelo indiciamento de Bolsonaro, conhecido como capataz de Alexandre de Moraes. A denúncia do meu irmão tem o aval de 131 delegados”, dizia a publicação. Para o STF, Eustáquio usou os filhos para expor o delegado da PF.
“Os filhos estão no Reino da Espanha com o pai, Oswaldo Eustáquio Filho, que os gravou e os orientou a fazer declarações, como forma de expor ou intimidar o delegado através do impacto mediático de tais declarações. À medida que a investigação avançava, foi identificado que o perfil X/Twitter ligado à adolescente Mariana Volf Pedro Eustáquio também é utilizado por seu pai, que se aproveitou de sua condição de menor para realizar condutas que obstruem a investigação, tentando fugir de sua responsabilidade criminal”, alegou o juiz auxiliar do STF.
Mariana e a mãe, Sandra Wolf, que moram em Brasília, foram alvos de uma operação da PF em agosto do ano passado, após as publicações. Elas tiveram os passaportes e celulares apreendidos, e estão proibidas de acessar seus perfis nas redes sociais.