Joilson Souza

Joilson Souza.
Professor da Sala de Recursos da escola Petrônio Pinheiro.

Na pressa de resolver os conflitos da vida moderna, um novo hábito começa a se naturalizar dentro das casas e escolas: transformar o comportamento infantil em diagnósticos.

A criança que não para quieta logo ganha a etiqueta de TDAH, a que se entristece é carimbada como depressiva, a que prefere o silêncio é rapidamente chamada de autista, e a que insiste em testar limites recebe o título de transtornada. A indústria farmacêutica, com sua força silenciosa e eficiente, descobriu um alvo certeiro: a infância. Quanto mais cedo o rótulo é colado, mais longa será a fidelização ao remédio que promete conter, mas raramente cura.

É verdade que transtornos existem e precisam ser respeitados. Mas o alerta se levanta contra o excesso. Estamos formando uma geração que cresce acreditando que nasceu com defeito, quando muitas vezes carrega apenas a energia própria da idade, o cansaço do ambiente em que vive ou a falta de acolhimento no espaço familiar e escolar.

As escolas, sobrecarregadas, e as famílias, exaustas, encontram no diagnóstico o alívio que não conseguiram no diálogo, no cuidado com o sono, na alimentação equilibrada, na escuta atenta e nos afetos. O que antes era temperamento, agora se transforma em doença; o que era sofrimento, em desequilíbrio químico; o que era diferença, em patologia. É mais fácil justificar a desobediência com um laudo do que enfrentar a complexidade de educar, orientar e amar.

Não se trata de negar a ciência, mas de questionar a pressa em medicar. Cada comprimido colocado na palma da mão de uma criança é uma decisão grave. O rótulo precoce pode se tornar uma prisão invisível, que acompanha pelo resto da vida. Talvez quem precise de cura não seja a criança, mas o sistema que a cerca: escolas que pedem silêncio em vez de expressão, famílias que desejam obediência em vez de criatividade, uma sociedade que cobra funcionalidade em vez de humanidade.

Enquanto isso, a indústria agradece. Garante seus lucros enquanto o alvo segue de mochila nas costas, lancheira colorida na mão, acreditando que pode ser o que quiser, mas tendo sua essência adormecida por medicamentos que apagam a chama da infância.

O alerta é simples e urgente: antes de rotular, acolha. Antes de medicar, escute. Muitas vezes, o que o filho precisa não é de comprimidos, mas de atenção, afeto e tempo verdadeiro. Porque nenhuma infância pode florescer se for sufocada por diagnósticos que transformam a beleza da diferença em doença.

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