
A morte do menino Benício, após uma falha grave no atendimento médico no Hospital Santa Júlia, em Manaus, ultrapassou as fronteiras do Amazonas e passou a influenciar discussões no Congresso Nacional sobre a qualidade da formação médica no Brasil. Diante da repercussão do caso, o senador Eduardo Braga (MDB-AM) voltou a defender alterações profundas no modelo de ensino da Medicina, com avaliações periódicas ao longo da graduação e a criação de um Exame Nacional de Proficiência como etapa obrigatória antes do exercício profissional.
O tema ganhou força após a Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado aprovar um projeto de lei que institui a prova nacional para médicos recém-formados. Integrante da comissão, Braga avalia que a simples aplicação de um exame ao final do curso não é suficiente para garantir a qualidade da formação, sobretudo diante do crescimento acelerado do número de faculdades de Medicina no país.
O caso que motivou a intensificação do debate envolve a aplicação inadequada de adrenalina diretamente na veia da criança, procedimento considerado incompatível com protocolos básicos de atendimento. Para o senador, o episódio evidencia falhas que não podem ser tratadas como exceção.
“O que aconteceu com o menino Benício é criminoso e inadmissível. Situações como essa mostram que algo está errado na formação de parte dos profissionais e isso precisa ser corrigido ainda dentro das universidades”, afirmou Braga.
O parlamentar defende que o processo de avaliação dos estudantes de Medicina tenha início a partir do quarto ano da graduação, estendendo-se pelos anos seguintes, de forma contínua e criteriosa. A proposta é que apenas alunos que comprovem preparo técnico e ético adequado recebam o diploma.
Nesse formato, o Exame Nacional de Proficiência atuaria como uma etapa final de validação, antecedendo a concessão do registro profissional (CRM). Braga também ressalta a necessidade de maior fiscalização sobre os cursos de Medicina, especialmente diante da expansão acelerada de instituições sem a devida estrutura para formação de profissionais da saúde.
O projeto aprovado na CAS ainda seguirá para análise do Plenário do Senado e, posteriormente, da Câmara dos Deputados. Para o senador amazonense, discutir a qualidade da formação médica é uma questão de responsabilidade pública.
“Garantir que os médicos formados no Brasil tenham preparo técnico e sensibilidade humana não é apenas uma pauta educacional, é um compromisso com a vida”, concluiu.
Entenda
O pequeno Benício Xavier, de 6 anos, foi levado pelos pais ao Hospital Santa Júlia, em Manaus, após apresentar tosse seca e suspeita de laringite. O quadro inicial não indicava gravidade, mas o atendimento médico culminou em uma sequência de procedimentos que levaram à piora acelerada do menino.
Segundo o pai, Bruno Freitas, a médica responsável prescreveu lavagem nasal, soro, xarope e três doses de adrenalina intravenosa, com 3 ml aplicados a cada 30 minutos. A família, surpresa com o método — já que Benício jamais havia recebido adrenalina pela veia — chegou a questionar a técnica de enfermagem. Ela afirmou que também nunca havia feito aplicação intravenosa, mas seguiria a prescrição médica.
Logo após a primeira dose, Benício apresentou reação súbita e grave, sendo levado para a sala vermelha. A oxigenação caiu para 75%, e uma segunda médica foi acionada para iniciar o monitoramento cardíaco. Diante da piora, foi solicitado um leito de UTI, e o menino foi transferido no início da noite.
Na UTI, o quadro continuou instável. A equipe informou aos pais que seria necessária a intubação, realizada por volta das 23h. Durante o procedimento, Benício sofreu as primeiras paradas cardíacas. Segundo o pai, houve sangramento porque o menino vomitou no momento da intubação. Mesmo após manobras de reanimação, Benício não resistiu e morreu às 2h55 da madrugada de domingo.
A família afirma que busca justiça e que espera que erros como esse não voltem a acontecer.
“Não desejamos essa dor para ninguém”, disse Bruno.
Em nota, o Hospital Santa Júlia informou que a médica e a técnica de enfermagem envolvidas no atendimento foram afastadas, e que a instituição abriu uma investigação interna, conduzida pela Comissão de Óbito e Segurança do Paciente.










