
Nos dias que se seguiram, a escola deixou de ser apenas pedra, tinta e calendário. Cada sala parecia respirar com sua própria cadência, cada corredor guardava ecos de pequenas epifanias, e os livros abertos, com suas páginas esvoaçantes, carregavam chamas silenciosas de curiosidade que eu podia quase sentir no ar.
O barulho do recreio não era mais mero som; era uma sinfonia fragmentada de perguntas, risos e descobertas que dançavam, invisíveis, entre paredes e janelas. E eu, no meio disso, percebia que a função de ensinar ultrapassava qualquer currículo: era tocar corações, acender inquietações, despertar olhares que ousam sonhar.
— Professor, posso lhe mostrar algo que escrevi? — disse Ana, estendendo um caderno onde as palavras se completavam com desenhos nos cantos das páginas, pequenas constelações de pensamento.
— Claro — respondi, sentindo novamente o arrepio antigo que a sinceridade do aprendizado provoca. — Cada palavra que você escreve é uma ponte entre o que pensa e o que sente. Mostre-me não só o que aprendeu, mas como isso transformou seu olhar sobre o mundo.
Ao caminhar entre os alunos, percebia a dança silenciosa do conhecimento: mãos que se erguiam hesitantes, olhos que brilhavam com novas perguntas, bocas que murmuravam pequenas ideias, corações que se encantavam. Cada gesto era a prova de que aprender é também uma forma de amar, uma aproximação profunda da vida, feita com respeito, intensidade e delicadeza.
Na biblioteca, Joana, professora de Geografia, com cuidado quase reverente, lia um livro de histórias antigas. Sentei-me ao seu lado, e, por um instante, o silêncio nos envolveu como um véu. Então ela falou, quase sussurrando:
— Professor, ensinar é como plantar sementes, não é? A gente nunca sabe como vão crescer, mas precisa cuidar com carinho.
Sorri, tocado pela profundidade daquela observação.
— Exatamente — disse. — Cada aluno é um jardim único. O que semeamos com atenção e afeto floresce de maneiras que nem imaginamos.
Ao final do dia, de volta à sala dos professores, liguei o computador. Encontrei o arquivo “Amor Platônico – Confidencial” e digitei, mais uma vez:
“O amor pelo conhecimento é silencioso, mas potente. Ele se espalha em perguntas, em olhares atentos, em mãos que escrevem e corações que escutam. Ensinar é ser jardineiro da curiosidade, e amar é regar as sementes que germinarão no tempo certo.”
Fechei o computador, olhei pela janela o sol que se punha sobre o pátio da escola, tingindo tudo de dourado e sombra, e percebi que a herança de uma paixão antiga, de um amor platônico que me ensinou a viver, agora floresce em cada aluno que se entrega ao saber. Um ciclo silencioso, poético e eterno.
E, naquele instante, compreendi: ensinar e amar não são meras palavras; são forças que se entrelaçam e, em sua potência criadora, iluminam o mundo, tornando-o mais justo, mais humano, alegre, colorido e digno de ser habitado.
Luís Lemos é professor, filósofo, escritor, autor, entre outras obras de, “O primeiro olhar” (2011), “O homem religioso” (2016), “Jesus e Ajuricaba na terra das amazonas” (2019), “Filhos da quarentena” (2021), “Amores que transformam” (2024) e “Noite Santa” (2025).
Instagram: @luislemosescrito







