O juiz de Direito substituto Pedro Camara Raposo Lopes, em exercício na Vara Criminal de Pará de Minas, em Minas Gerais, libertou preso em flagrante por ter furtado garrafa de whisky de um supermercado para trocar por pedras de "crack", apesar dos maus antecedentes do indiciado.

O magistrado reconheceu que a jurisprudência majoritária é no sentido do decreto de prisão preventiva em hipóteses em que o indivíduo reiteradamente vem praticando crimes, a fim de resguardar a ordem pública.

Considerou, no entanto, que se deve ter "redobrada cautela" sob pena de banalização da prisão, "máxime em se tratando de crimes ligados à drogadição" e que conceitos como "ordem pública" e "periculosidade social" devem ser interpretados à luz do resultado útil para o processo, evitando-se a punição por antecipação.

Ao fazer referência à atual situação carcerária do país, com seus quase 700 mil presos e dos quais um terço aguarda julgamento, o juiz asseverou: “Prende-se pouco. Prende-se mal.” Isso porque, afirma, embora com o título de um dos países que mais encarcera pessoas no mundo, “apenas 9% dos homicídios são apurados”.

“O magistrado é um homem de seu tempo. O conceito de ordem pública do vetusto Código de Processo Penal, editado sob o regime ditatorial do Estado Novo, não é o mesmo conceito de ordem pública dos tempos de normalidade institucional, ou dos anos plúmbeos, ou dos anos de verdadeira guerra urbana que atravessamos. A rotina judiciária não pode e não deve servir de sucedâneo de políticas públicas ligadas às áreas de saúde e de segurança.”

De acordo com o julgador, ordem pública a que se refere o Código de Processo Penal, no atual contexto brasileiro, “não pode se traduzir numa opção discricionária do magistrado a respeito da conveniência e da oportunidade de se eliminar episodicamente do convívio social o indivíduo carente de políticas de Estado inclusivas, atulhando as penitenciárias com um contingente imenso de usuários de drogas cometedores de pequenos delitos de irrisória ofensividade e que acabam virando massa de manobra de facções criminosas que grassam nas unidades de norte a sul, de leste a oeste deste país”.

Assim, conclui, é preciso que exista evidências de que o indiciado não só é dado à prática de injustos com a finalidade de adquirir as drogas, “mas que faz disso seu modus vivendi, de modo que ele, em liberdade, possa solapar a ordem pública”.

Lembrando lição do jurista Daniel Sarmento, na ocasião da ADPF 347 e do reconhecimento pelo STF do chamado "Estado de coisas inconstitucional" do Sistema Penitenciário brasileiro, pontuou "que a prevenção geral e especial se resolvem com a justa aplicação da pena, a seu tempo e modo, de forma proporcional".

Ao conceder alvará de soltura, o magistrado determinou o acompanhamento do caso pelo Conselho da Comunidade com o encaminhamento do preso para o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas do município.

(Migalhas)

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