O 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro retomou, nesta quinta-feira (31/10), o julgamento dos assassinos confessos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. É o segundo dia da apreciação do caso. A sessão teve início no Fórum Central do Rio às 9h20. Os jurados passaram a noite no prédio da Justiça para garantir a incomunicabilidade com terceiros.
Encerrada a fase dos depoimentos, o dia deve ter as argumentações de acusação e defesa, bem como a votação por parte do júri que vai definir se os dois réus são culpados ou inocentes. À juíza, caberá efetuar a dosimetria da pena, ou seja, estipular por quanto tempo os dois ainda vão ficar presos.
Na quarta-feira (30/10), foram apresentados os depoimentos de membros da equipe de investigação; da viúva do motorista Anderson Torres, Agatha Arnaus; da viúva de Marielle, Mônica Benício; a mãe de Marielle Franco, Marinete da Silva; a ex-assessora de Marielle, Fernanda Gonçalves Chaves; e os executores, Ronnie Lessa e Élcio Queiroz.
As perguntas foram feitas pelos representantes do Ministério Público, assistentes de acusação e a defesa dos réus. A primeira pessoa a prestar esclarecimentos foi a assessora de Marielle, Fernanda Chaves. De forma remota, ela deu detalhes do que sentiu na cena do crime.
“Eu não enxergava direito, meu corpo inteiro ardia, eu não sabia se estava ferida ou não. E eu olhava para a Marielle lá dentro, e queria acreditar que ela estava viva, que ela estava desmaiada, até porque eu saí tão inteira dali que não imaginei que ela pudesse estar morta”, disse.
A mãe de Marielle, Marinete da Silva narrou parte da vida da filha. Marinete disse que a filha teve uma infância feliz e que a família focou na educação. Ela acrescentou ter orgulho da história da filha e ressaltou a importância de a justiça ser feita. “É inadmissível que a gente não tenha um desfecho disso aqui que a gente está tendo hoje”, afirmou.
Viúva de Marielle, Mônica Benício, falou dos planos de Marielle, do desejo de ambas de se casarem com uma festa, e que pensou em tirar a própria vida após a perda da companheira. Assim como a mãe da vereadora, ela cobrou justiça.
“Dentro do que é possível, espero que se faça a justiça que o Brasil, o mundo espera há 6 anos e 7 meses, porque isso é importante também, não só para o símbolo, mas para a Marielle, defensora dos direitos humanos, e para a família do Anderson, para que possamos dar o exemplo de que crimes como esses não podem existir”, exclamou.
A viúva de Anderson, Agatha Arnaus, cria um filho com deficiência e descreveu as dificuldades que enfrenta sozinha, desde o assassinato do marido. A mulher disse que sem o pai, o filho passa por sofrimento. “Eu tenho certeza de que a ausência do Anderson impactou o desenvolvimento do Arthur. A primeira palavra que ele falou foi ‘papai’.”
Agentes da Polícia Civil (PC) e da Polícia Federal (PF) deram detalhes da investigação do caso. O agente da polícia federal Marcelo Pasqualetti, afirmou que, ao terem conhecimento dos indícios apurados na investigação, Élcio e Lessa perceberam que não havia saída para eles. “Estava bem evidente a participação deles, não tinham outra saída a não ser fazer a colaboração”, disse.
Ronnie Lessa
O depoimento de Lessa, prestado remotamente, confirmou a versão dada por ele para o crime na delação premiada que firmou. Ele disse que Edmilson Oliveira da Silva, conhecido como Macalé, foi quem falou do “serviço”.
O valor oferecido para assassinar Marielle foi de R$ 25 milhões, segundo ele. Lessa disse que convidou, no réveillon de 2017 para 2018, Élcio Queiroz para a prática do delito, pois este, afirmou ele, estaria passado por dificuldades financeiras e que pretendia ajudar o amigo.
Lessa disse que, embora tenha chamado Élcio para cometer o crime meses antes, não expôs a ele qual seria o alvo, pois tinha medo de que o amigo falasse inadvertidamente sobre o que planejavam fazer. Segundo Lessa, Élcio foi informado de quem seria a vítima apenas no dia do crime.
Élcio Queiroz
Élcio Queiroz confirmou os fatos narrados por ele na delação premiada, destacando principalmente a dinâmica dos fatos. O réu reafirmou a amizade de longa data com Lessa, e que no dia do crime, na porta do local onde havia a reunião de Marielle, viu que a hora do assassinato estava próxima. Segundo Élcio, Lessa disse: “Você vai ter que me ajudar”. “Ele foi abrindo a bolsa, tirou a arma e colocou a jaqueta”, narrou.
Diferente do que disse Lessa, o réu contou que só soube do crime no dia do fato. Segundo ele, Lessa o teria chamado para realizar um “trabalho”. Por outro lado, disse saber do envolvimento de Lessa em atividades criminosas.
Questionado pelo Ministério Público porque não freou o carro que dirigia durante a perseguição que fazia ao carro onde estava Marielle, ele disse que não poderia fazer um “refugo”, pois se tornaria um alvo, ou seja, estaria marcado para morrer.
Mandantes
Os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão são acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de serem os mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco, que, consequentemete, resultaram no homicídio de Anderson Gomes. Eles negam envolvimento. O caso dos mandantes corre em separado no Supremo Tribunal Federal (STF).
O objetivo dos irmãos Brazão era para impedir que a vereadora continuasse prejudicando os interesses dos dois, desde nomeações para o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) até a regularização de loteamentos irregulares em áreas dominadas por milícias na zona oeste do Rio de Janeiro.
No processo, além dos irmãos, foram denunciadas mais três pessoas: dois policiais que atuavam para a dupla e o ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa.