Antes tarde do nunca, Tribunal de Contas do Estado enfim esclarece que empreiteira Pampulha recebeu dos cofres públicos do estado, adiantado, R$ 18 milhões por obras que só foram realizadas depois do escândalo.
Com o tempo, os discursos se acalmaram e mais uma vez a sociedade ficou sem o esclarecimento necessário do caso Pampulha até a decisão proferida, hoje, pelo conselheiro convocado Mário José Moraes Costa Filho, que culminou em multa no valor de R$ 40.362,69 e individualmente, a Antunes Bitar Ruas, André Gomes de Oliveira, Francisco Corrêa de Lima, Faustiniano Fonseca Neto e Marco Aurélio de Mendonça e a empresa Pampulha Construções e Montagens Ltda., representada pelo Sr. Alexandre Magno Fernandes Lages.
Multou, ainda, com fundamento nas disposições do art. 54, II, da Lei n.o 2.423/96 c/c art. 308, VI, do RI-TCE/AM, Marco Aurélio de Mendonça em R$ 10.000,00 devido às irregularidades, como ausência de comprovação de previsão de recursos orçamentários e pagamento antecipado por obras não realizadas.
E ainda Antunes Bitar Ruas, André Gomes de Oliveira, Francisco Corrêa de Lima, Faustiniano Fonseca Neto e Marco Aurélio de Mendonça e a empresa Pampulha Construções e Montagens Ltda., representada por Alexandre Magno Fernandes Lages, foram terão de devolver aos cofres públicos R$ 4.036.269,00 (quatro milhões, trinta e seis mil, devido à inexecução de obras em favor da administração pública conforme relatório de inspeção extraordinária.
O esquema
O esquema de desvio de recursos públicos que a imprensa local classificou de Caso Pampulha, e resultou em pagamento antecipado de R$ 18 milhões para a Pampulha, é emblemático e deixa patente como as coisas acontecem no Amazonas.
A denúncia veio a público em janeiro de 2008, mas somente nesta quarta-feira, 10, oito anos depois, portanto, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) concluiu o relatório informando o que todo mundo já sabia: a Pampulha recebeu adiantado por obras não realizadas nos municípios do Alto Solimões.

Esse desenho ficou claro desde quando a imprensa noticiou que a empresa Pampulha Empreendimentos e Construções Ltda havia recebido tal quantia sem que as obras fossem realizadas.
A partir daí se iniciou uma verdadeira pirotecnia para encobrir o desvio dos recursos, até com a conivência do próprio TCE, mais precisamente na pessoa do conselheiro Júlio Pinheiro, que usou de todos os ardis para retardar as investigações do órgão, que se viu na incômoda obrigação de dar uma explicação para a sociedade.
A história toda pode ser resumida da seguinte maneira. A Pampulha ganhou a licitação, no valor total de R$ 34 milhões, mas queria receber adiantado R$ 18 milhões, sem sequer ter gasto um saco de cimento nas obras.
Então armou-se uma trapalhada na Secretaria de Infra-Estrutura (Seinf), como laudos atestando a conclusão das obras e, assim, se autorizou pagamento pelo asfaltamento de ruas que não existiam (ver foto).
Quando o caso foi descoberto, o TCE enviou uma comissão ao local que nada averiguou e a Pampulha foi forçada a tocar as obras a toque de caixa, para que as obras pudessem ser veiculadas na propaganda oficial do governo do Estado.
Depois de mais de um ano, as obras foram concluídas e o TCE pôde enfim vir a público e dizer que na época as obras não existiam, mas agora estão concluídas e pedir a punição do ex-secretário da Seinf, Marco Aurélio, como se ele fosse o único culpado.
O ex-secretário jamais autorizaria o pagamento de R$ 18 milhões à Pampulha por obras não realizadas se não tivesse recebido orientação superior, até porque o esquema foi de uma inocência que somente a certeza da impunidade é capaz de engendrar.
A começar pelas datas, uma vez que a licitação foi concluída em dezembro de 2007 e neste mesmo mês a Seinf autorizou o pagamento da primeira parcela, de R$ 10 milhões, como se parte das obras tivesse sido concluída.
Em janeiro de 2008 outra parcela, desta vez de R$ 8 milhões, foi recebida pela empreiteira referente a outro trecho das obras que sequer tinham sido iniciadas.
Uma consulta rápida no Diário Oficial do Estado mostrou a incompatibilidade de tempo razoável para uma empresa vencer uma licitação e, em menos de um mês, receber duas parcelas referente à conclusão de parte das obras.
O que parecia ser suspeito se transformou em escândalo quando se confirmou que as obras não existiam: elas eram fantasmas, mas já haviam rendido uma fortuna aos cofres da Pampulha.
A partir daí se iniciou a operação abafa. O TCE e o Ministério Público Estadual, órgãos nos quais o governo exercia forte influência política, formaram uma comissão mista para verificar in loco a situação das obras.
Os fiscais se deslocaram aos municípios do Alto Solimões em fevereiro de 2008, mas em maio o relatório que deveriam apresentar, no prazo máximo de sessenta dias, não foi concluído e nunca foi revelado à sociedade.
Esgueirando-se em chicanas jurídicas, entra em ação o conselheiro Júlio Pinheiro, e pede vistas do processo e uma nova comissão de fiscalização das obras.
O tempo passou, a Pampulha concluiu as obras de qualquer jeito e agora o TCE enfim dá uma resposta à sociedade sobre o caso: o mordomo é o culpado, e Marco Aurélio será punido pelo pagamento antecipado de R$ 18 milhões à Pampulha por obras não realizadas nos municípios do Alto Solimões. Um final trágico para os amazonenses, se não fosse cômico. É palhaçada.
Obras realizadas a toque de caixa
Flagrada com a galinha roubada debaixo do braço, a construtora Pampulha colocou um verdadeiro exército para concluir obras consideradas fantasmas no Alto Solimões, com mais de 400 homens e máquinas trabalhando 18 horas por dia.
A pressa se justifica porque a empresa recebeu dinheiro da sociedade sem ter batido um prego em barra de sabão.
A Pampulha não estava delinquindo sozinha, porque por trás havia agentes do Estado fazendo o trabalho sujo de transformar recursos públicos em bens privados. Por isso a empresa foi obrigada a retornar ao local do delito para limpar suas digitais.
A expressão pode ser exagerada, mas não há outra relação a fazer entre o crime de homicídio e o ataque violento ao erário que foi esse escândalo do pagamento antecipado por uma obra que não seria concluída se a “operação ratoeira” não tivesse vazado.
A Pampulha apostou na falta de memória da população, no isolamento do interior e nas falhas da fiscalização. Mas foi uma aposta errada. O que está fazendo agora é correr atrás de um prejuízo que poderia ser maior se os contratos, viciados, fossem rescindidos e a empresa proibida de prestar serviços para o Estado.
Como houve omissão de todos os lados, a Pampulha tocava uma obra que deveria estar parada, uma vez que era objeto de ação judicial. Mas mesmo correndo contra o tempo para alegar que não causou dano, não conseguirá reduzir o seu extenso prontuário.
O procurador estadual à época, Francisco Cruz, disse que, do ponto de vista jurídico, a lesão ao patrimônio já está materializada, ainda que a obra esteja pronta quando o caso for a julgamento.
“O certo era ter cessado a atuação da empresa e bloqueado as suas contas, para não dar a chance deles correrem e aprontar o serviço e na época do julgamento alegar que não houve prejuízo ao erário”, dizia o procurador. Para o ex-presidente da OAB, Aristófanes Castro, já falecido, a conclusão da obra não deve interferir nos autos do processo.
Estado teve prejuízo de R$ 29 mi, diz TCE
A inspeção do Tribunal de Contas realizado àquela época no Alto Solimões revela que a Secretaria de Infra-estrutura autorizou pagamento pelo asfaltamento de ruas que não existem e detectou dois contratos para uma mesma obra.
De acordo com o relatório, os prejuízos para o Estado somam R$ 29 milhões, dinheiro surrupiado do contribuinte e que foi parar nas contas da construtora Pampulha que é bem possível que nem exista mais.
Desta forma, o Ministério Público Estadual insistia no bloqueio das contas da empresa Pampulha e no cancelamento dos contratos da construtora com o Estado por alegar que as irregularidades eram claras.
O MPE estranhou, inclusive, o fato da juíza, então titular da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual, Etelvina Lobo Braga, não ter acatado na sua integridade a ação civil pública movida contra Estado do Amazonas.
O MPE pediu ação civil contra a Sociedade Civil de Desenvolvimento Integrado Sustentável da Mesorregião do Alto Solimões, Pampulha Construções e Montagens LTDA, Alexandre Magno Fernandes Lages, Antunes Bitar Ruas, Marco Aurélio Mendonça, André Gomes de Oliveira, Faustiniano Fonseca Neto, Francisco Corrêa de Lima, Tyssia Régia Rayol Cavalcante Oliveira e os municípios de Benjamin Constant, Fonte Boa, São Paulo de Olivença, Santo Antônio do Içá e Tabatinga.
A juíza, por seu turno, determinou o afastamento do cargo dos agentes públicos envolvidos no episódio, por entender que as irregularidades foram confessadas durantes os interrogatórios e pede à Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas a suspensão do contrato com a construtora, a apreensão dos livros-caixas, livros-razão e dos computadores da Pampulha para avaliar os balancetes e fazer perícia técnica e contábil.
Solicitou, ainda, que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) rastreiasse os pagamentos feitos à construtora.
ALE fugiu da responsabilidade
A Assembleia Legislativa do Estado foi chamada para cumprir seu papel de fiscalizadora do Executivo, que tão mal e estranhamente se recusava a fazer em defesa dos interesses da sociedade.
Deputados de oposição entraram com um requerimento solicitando a constituição da CPI da Pampulha, mas como tudo indicava, foi mais uma queda de braço que os parlamentares aliados ao governo venceram.
Os oposicionistas esperavam contar com a assinatura do deputado Sabá Reis, na época feroz crítico do governo, mas ele se escondeu na hora da verdade e não colocou seu nome no pedido de CPI.
Assinaram o pedido, além do próprio Bisneto, Angelus Figueira, Liberman Moreno, Wallace Souza, Luiz Castro e Walzenir Falcão.
A ideia de criar uma CPI, desde o início, estava fadada ao arquivamento, pois uma investigação séria, que jamais aconteceu no âmbito da ALE, poderia chegar à porta do gabinete do governador Eduardo Braga, com consequências imprevisíveis.










