
A defesa da médica Juliana Brasil Santos, investigada pela morte do menino Benício Xavier de Freitas, de 6 anos, sustenta que o erro de prescrição que levou à administração de adrenalina por via intravenosa — procedimento que agravou o quadro clínico da criança — foi provocado por uma falha do sistema informatizado do Hospital Santa Júlia, e não por ação ou negligência da profissional. As informações constam no habeas corpus preventivo apresentado ao Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM).
No documento, os advogados Felipe Braga de Oliveira e Alessandra Seriacopi Vila afirmam que o sistema interno do hospital apresentou instabilidade no dia do atendimento e que a médica selecionou corretamente, em campo específico do sistema, a via de nebulização para a administração da adrenalina — conduta compatível com os protocolos pediátricos. Contudo, segundo a defesa, o sistema teria alterado automaticamente a via para intravenosa, sem que a profissional percebesse a mudança.
Os advogados apresentaram um vídeo que, segundo eles, demonstra problemas na plataforma de prescrição utilizada pela unidade.

Um trecho do habeas corpus — baseado no depoimento do pediatra Luiz Felipe Reis Carvalho Sordi, que também atua no Hospital Santa Júlia — reforça essa possibilidade. Ele afirma que o software possui um campo no qual a via é “clicada”, mas que o sistema pode, sozinho, modificar a forma de administração, sem intervenção do prescritor, especialmente no caso de medicamentos de alta vigilância, como a adrenalina.

Médica teria seguido os protocolos após ser informada da aplicação incorreta
Segundo a defesa, Juliana não aplicou a medicação — o procedimento foi realizado por uma técnica de enfermagem. A médica só tomou conhecimento de que a adrenalina havia sido administrada na veia quando foi chamada pela equipe. A partir desse momento, conforme o documento, ela:
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encaminhou o menino imediatamente à sala vermelha;
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permaneceu ao lado do paciente durante todo o atendimento;
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solicitou a transferência urgente para a UTI;
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prescreveu o antídoto adequado (propranolol), embora sua aplicação tenha sido impedida pelo intensivista;
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continuou acompanhando o caso mesmo após o fim do plantão.
A defesa frisa que não houve indiferença ao risco de morte, afastando a hipótese de dolo eventual levantada pela polícia. “Erro não configura dolo”, afirmam os advogados.
Falha sistêmica e falha de checagem
O habeas corpus destaca que a prescrição estava correta em todos os parâmetros — dose, intervalo e indicação — exceto na via de administração, que teria sido modificada automaticamente pelo sistema. A defesa também aponta falha de checagem da enfermagem, já que a mãe de Benício chegou a questionar a técnica antes da aplicação do medicamento.
Investigações e divergências nos depoimentos
Apesar dos argumentos da defesa, o delegado Marcelo Martins, titular do 24º DIP, confirmou que investiga a possível falha do sistema, mas classificou o caso como homicídio doloso qualificado, incluindo a hipótese de crueldade. Ele chegou a pedir a prisão preventiva da médica, mas Juliana permanece em liberdade graças ao habeas corpus concedido pela Justiça.
A Polícia Civil já ouviu o médico Enryko Queiroz, que confirmou as trocas de mensagens com Juliana no dia do atendimento, e o enfermeiro Tairo Neves, que disse ter trabalhado sozinho — o que contraria a versão apresentada pela médica. Uma acareação entre Juliana e a técnica de enfermagem está marcada para o dia 4.










