Reveladas pelo site Intercept no último domingo (9), mensagens trocadas entre o procurador do Ministério Público Federal (MPF) Deltan Dallagnol e o então juiz federal Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, revelam um “diálogo impróprio” entre os dois, segundo avaliação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello.

“Em tese, não admite-se diálogo privado entre estado acusador e estado juiz. Nem entre estado juiz e advogado de defesa. Não cabe. O juiz fala no processo”, afirmou o ministro ao Congresso em Foco. “O diálogo é impróprio”, completa.

Uma das reportagens publicadas pelo site mostra mais de um momento em que Moro, então condutor em primeira instância dos processos do esquema de corrupção da Petrobras, dá orientações e debate estratégias com Dallagnol, ainda hoje coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Paraná. Em nota emitida no domingo, Moro defende que “não se vislumbra [nas mensagens] qualquer anormalidade ou direcionamento da atuação enquanto magistrado, apesar de terem sido retiradas de contexto”. Já o MPF afirma que age com imparcialidade, o que se comprova, segundo o órgão, “por inúmeros pedidos do Ministério Público indeferidos [por Moro]” e por 54 absolvições de pessoas acusadas na Lava Jato.

Juristas consultados pelo Congresso em Foco afirmam que as conversas abrem brecha para que advogados de defesa, especialmente a do ex-presidente Lula, possam pedir a nulidade do processo do tríplex do Guarujá (SP), pelo qual o petista está preso. A avaliação de que a legitimidade das ações pode ser questionada é sustentada pelo artigo 254 do Código de Processo Penal (CCP), que especifica as situações em que um juiz deve declarar-se suspeito. Uma delas, descrita no inciso IV, é “se tiver aconselhado qualquer das partes”.

“O juiz não pode dar aconselhamento prévio para o advogado de defesa, assim como não pode aconselhar o órgão de investigação. Isso é uma causa objetiva de suspeição do juiz”, afirma o jurista João Rafael de Oliveira, professor de Direito Processual Penal na Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst).

Outro criminalista, o advogado João Paulo Boaventura – sócio do escritório Boaventura Turbay Advogados –, concorda que pode haver base para pedidos de nulidade, mas a análise terá que ser feita sobre cada processo e cada réu. “Naqueles casos em que ficar provado que o juiz tenha aconselhado uma das partes, aí sim teríamos uma nulidade imediata. Mas não vejo, pelo menos com o que foi revelado até aqui, uma nulidade ampla, geral, da operação. Vai depender de cada caso”, pondera Boaventura.

Ouvido pelo Congresso em Foco, o ministro Marco Aurélio também vê a situação com cautela. “Isso aí [se as conversas poderão embasar um pedido de nulidade] nós não sabemos, temos que esperar. É claro que é sempre possível uma revisão. Mas isso caberá a quem de direito analisar”, avalia o magistrado.

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