O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, afirmou, em entrevista à jornalista Camila Bomfim, do g1, que os Estados Unidos podem ter desrespeitado pelo menos quatro frentes diferentes da Justiça brasileira ao manter deportados brasileiros algemados ao pousar no país. Lewandowski atuou diretamente no caso e determinou a retirada imediata das algemas do grupo.
Segundo o ministro, além de atentar contra os direitos humanos garantidos aos brasileiros, os agentes americanos feriram a Constituição brasileira. “Cidadãos brasileiros contra os quais nada pesava criminalmente, ao pisar em solo brasileiro , estavam sob a proteção de tratados internacionais, da Constituição, da súmula 11 do STF [que regula uso de algemas], e da portaria do MJ sobre uso progressivo da força, que também tem artigo sobre algemas”, explica.
O governo brasileiro já se manifestou sobre o ocorrido, anunciando que solicitará esclarecimentos oficiais dos Estados Unidos. A questão também gerou repercussão internacional, com o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, entrando em confronto público com o ex-presidente Donald Trump, abordando a delicada questão dos direitos dos deportados.
Lewandowski detalhou as normas violadas pelos Estados Unidos, destacando que, ao operar no Brasil, a legislação brasileira deve prevalecer sobre as regras americanas. Entre as normas infringidas, estão:
Constituição Federal: Em vigor desde 1988, a Constituição brasileira estabelece a “dignidade da pessoa humana” como um princípio fundamental, garantindo os direitos humanos e a dignidade de todos os cidadãos, incluindo aqueles que retornam ao Brasil após a deportação.
Tratado de Deportação: O acordo mais recente entre Brasil e Estados Unidos foi assinado em 2017, durante o governo de Michel Temer e Donald Trump. O tratado visa evitar que cidadãos brasileiros fiquem longos períodos em centros de detenção nos EUA, mas, segundo o Itamaraty, foi desrespeitado ao manter os deportados sob algemas e correntes.
Súmula 11 do STF: Essa súmula regula o uso de algemas em território brasileiro, permitindo seu uso apenas em casos de resistência, risco de fuga ou alta periculosidade. Ela ainda exige que o uso de algemas seja justificado por escrito, sob pena de nulidade do ato.
Portaria de Uso Progressivo da Força: Recentemente assinada pelo Ministério da Justiça, essa portaria também estabelece diretrizes claras sobre o uso de algemas e correntes, sendo a aplicação dessas medidas restritivas considerada ilegal, em situações que não envolvem risco iminente ou resistência.
Embora os Estados Unidos possuam uma política interna que permite o uso de algemas e correntes em deportações de estrangeiros em situação irregular, as autoridades brasileiras defendem que qualquer operação em solo nacional deve obedecer às normas do país. No caso específico, o voo dos deportados, que partiu de Manaus para Belo Horizonte no sábado, enfrentou problemas técnicos, mas, uma vez em solo brasileiro, o uso de algemas deveria ser proibido, visto que configura um “tratamento degradante” para os indivíduos envolvidos.
A súmula 11 do STF é clara a esse respeito. O dispositivo legal afirma que “só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia”, além de estabelecer que a excepcionalidade do uso de algemas deve ser justificada por escrito, sob pena de nulidade do ato e responsabilidades civis e penais.