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O destino do espião russo Sergey Vladimirovich Cherkasov, preso em Brasília desde o fim de 2022, está nas mãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O espião cumpre pena até 2027 em presídio federal, mas pode ser extraditado à Rússia de forma antecipada com aval jurídico.

A possível extradição de Cherkasov está neste momento sendo analisada pelo DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional), do Ministério da Justiça. A pasta recebeu um documento no começo deste mês do juiz Frederico Botelho de Barros Viana, da 15ª Vara Federal, que informou não ter mais processos contra o russo na esfera do Distrito Federal, o que antes seria um impeditivo à extradição solicitada pela Rússia.

O MJ também pediu atualizações para a Polícia Federal, à Justiça Federal de São Paulo, para a 4ª Vara do Rio de Janeiro, ao MPRJ (Ministério Público do Rio) e ao TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região).

O pedido à PF foi feito no começo de 2023 e a resposta da instituição saiu em junho de 2025. Atualmente, não há inquérito na PF contra Cherkasov, mas sim parte de uma investigação sobre 10 espiões russos que usaram o Brasil como país base, como mostrou a CNN Brasil em outubro

O espião foi preso em 2022 com uso de documento falso, se passando por brasileiro e nome de Victor Muller. Desde então ele está na Penitenciária Federal em Brasília, de segurança máxima. O local é o mesmo que abriga o chefe do PCC, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola.

Desde a prisão, dois países passaram a disputá-lo: Rússia e Estados Unidos. A Rússia foi a primeira a pedir a extradição dizendo que ele é procurado por tráfico internacional. O país enviou documentos ao Brasil que foram analisados pela PF, mas os investigadores não conseguiram atestar a veracidade e avaliaram que seria uma estratégia para “buscar” o espião de volta.

Os Estados Unidos também entraram na briga pela extradição com informações da CIA de que o espião russo também entrou no país com nome falso e teria espionado o país durante uma passagem em solo norte-americano para estudar em uma universidade.

Neste momento, a análise técnica é do Ministério da Justiça, que pode dar seguimento e aval à extradição com base nas investigações e processos já encerrados. Mas o caso terá a palavra final do Palácio do Planalto, com chancela de Lula.

Delegados da PF que descobriram essa rede de espiões no Brasil ouvidos sob reserva pela reportagem acreditam que o espião será extraditado “cedo ou tarde”. O que, na avaliação de alguns, enterrará toda a investigação.

Fábrica de espiões

A PF descobriu uma complexa e extensa “fábrica de espiões russos” no Brasil, com um esquema que foi ampliado e espalhado pela América Latina, tendo o Brasil como base de apoio por pelo menos 12 anos.

Dez pessoas investigadas foram descobertas em 2022, e ainda há um deles sendo investigado, em 2025, por uso de documentos falsos. Os espiões são suspeitos de usar o Brasil como território neutro e repassar informações de interesse à Rússia.

Segundo as investigações na Diretoria de Inteligência da PF, a rede utilizava disfarces inusitados. Um dos espiões atuava como dono de uma joalheira em Brasília; outro era um estudante e apaixonado pelo forró em São Paulo; enquanto uma outra atuava como modelo.

Nove deles, incluindo dois desses citados acima, já saíram do Brasil, após serem descobertos, menos o Sergey Vladimirovich Cherkasov.

O caso dele começou em São Paulo no início de 2022. Ele morava na capital paulista desde 2010 e se apresentava como Victor Muller com diversos documentos falsos, até ser preso tentando desembarcar em Amsterdã, na Holanda, e ser devolvido ao Brasil, em 2022.

O governo holandês devolveu Sergey após ele ter apresentado passaporte brasileiro falso para trabalhar no Tribunal Penal Internacional, em Haia. Voltando ao Brasil, foi preso por uso de documento falso. Com ele, a PF encontrou outros registros falsos e logo depois abriu outro inquérito por lavagem de dinheiro e espionagem.

A PF aponta, na investigação, que a intenção dele era conseguir acesso a informações sobre a Rússia no tribunal penal. O país comandado por Vladimir Putin não faz parte do órgão, e o presidente tem um mandado de prisão em aberto por crime de guerra de deportação ilegal de crianças de áreas ocupadas da Ucrânia para a Rússia.

O espião passou nove meses em uma cela da Polícia Federal de São Paulo até ser transferido para a Penitenciária Federal em Brasília, onde permanece. A investigação levantou documentos, imagens e áudios que apontaram a ligação dele com a rede.

Em algumas mensagens, ele avisa a superiores na Rússia que vai trabalhar no Tribunal Penal Internacional e também recebe a quantia de R$ 35 mil. O material foi levantado com base em quebras de sigilo bancários e documentos encontrados no celular do russo. O inquérito diz que ele recebia dinheiro de funcionários do governo russo no Brasil para se manter, afinal, não tinha trabalho.

A partir de Sergey e sua ligação com outros contatos, a investigação foi ampliada. A PF também mapeou que outros espiões no Brasil tinham apoio do consulado russo no Rio de Janeiro e da Embaixada da Rússia em Brasília. Um dos investigados era adido comercial no consulado e foi embora antes de prestar depoimento à PF.

Após três anos, a investigação sobre essa rede continua na sede da PF em Brasília, e há um detalhe com informações da CNN. A PF tem informações que os espiões usaram não só o Brasil, mas também outros países da América Latina como base, como Argentina e Venezuela. Todos com as mesmas características, mas muitos deles não são encontrados por conta do uso de documentos falsos.

Um casal russo, com filhos argentinos, foi descoberto em 2023 com o disfarce que lhes permitiu entrar na Eslovênia, país da União Europeia e membro da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Ao voltar para a Rússia, foram recebidos com buquê de flores no aeroporto por Vladimir Putin.

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