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A recente ampliação do acesso à mamografia pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para mulheres a partir dos 40 anos, anunciada em setembro pelo Ministério da Saúde, foi recebida com entusiasmo por sociedades médicas que há muito tempo defendiam a mudança. No entanto, o avanço reacende a discussão sobre como garantir que essa diretriz se traduza em acesso real em um sistema que já enfrenta dificuldades para atender a faixa etária anteriormente recomendada (50 a 69 anos).

Por anos, houve uma discrepância entre a recomendação brasileira e as orientações das sociedades médicas. A mastologista Danielle Martin Matsumoto, do Einstein Hospital Israelita, explica que “todas as sociedades relacionadas ao rastreamento do câncer de mama já recomendam que ele se inicie aos 40 anos, e que seja realizado anualmente”. A diretriz nacional anterior, de 2015, previa o rastreamento apenas para mulheres entre 50 e 69 anos, com um intervalo de dois anos entre os exames.

Epidemiologia Brasileira Impulsiona a Mudança

A justificativa para a alteração se baseia na epidemiologia brasileira, que difere de países com diretrizes mais tardias. Segundo Matsumoto, a idade média de incidência de câncer de mama nos Estados Unidos é de 62 anos, enquanto no Brasil é de 52 anos. Além disso, “mais de 20% das mulheres brasileiras recebem o diagnóstico abaixo dos 45 anos”, ressalta a médica.

Apesar de ser uma oportunidade para ampliar diagnósticos precoces, a redução da idade para o exame não garante automaticamente um maior acesso. Atualmente, o Brasil adota o rastreamento oportunístico, onde a mulher precisa procurar uma unidade básica de saúde por conta própria e depender da solicitação de um profissional.

Gargalos e Desafios para o Acesso Real

Vários obstáculos impedem que a nova diretriz se torne efetiva na prática:

  • Falta de Informação: Muitas pacientes desconhecem seus direitos ou a importância do exame.
  • Disponibilidade de Profissionais: A ausência de médicos ou enfermeiros para emitir o pedido é um “primeiro gargalo”, segundo a mastologista.
  • Desigualdade Geográfica: Em regiões mais remotas, o acesso a locais com mamógrafos é difícil.
  • Problemas de Agendamento e Qualidade: Desafios na marcação, disponibilidade de equipamentos e a qualidade dos laudos são preocupações.
  • Recursos Humanos para Laudo: “Precisamos garantir que haverá profissionais suficientes para laudar esses exames. A telemedicina pode ser uma saída, desde que seja bem organizada”, sugere Matsumoto.
  • Unidades Móveis: Embora aumentem a cobertura, elas não garantem o diagnóstico precoce se não houver um acompanhamento adequado, alerta Luiz Ayrton Santos Junior, presidente da Femama.
  • Impacto Esperado: Mais Diagnósticos, Menos Mortes e Redução de Custos
    A expectativa é que a ampliação do acesso leve a mais diagnósticos em estágios iniciais, o que, por sua vez, deve reduzir os índices de mortalidade por câncer de mama. A doença é a mais incidente em mulheres no Brasil, excluindo os tumores de pele não melanoma, com uma estimativa de 73.610 novos casos por ano entre 2023 e 2025.

“Quando usamos a mamografia anual em duas incidências, os estudos demonstram redução global de mortalidade em torno de 30%. Em mulheres com menos de 50 anos, esse benefício pode ser um pouco menor, ao redor de 20 a 25%”, destaca Danielle Matsumoto.

Além da melhora nos desfechos clínicos, espera-se uma redução nos custos para o SUS, já que o tratamento de tumores avançados é mais invasivo e oneroso. “Quanto mais precoce um tumor é diagnosticado, menores são os custos para o SUS e maiores os benefícios para a sobrevivência da paciente. É uma questão de otimização de recursos”, observa Santos Junior.

Decisão Compartilhada e o Futuro do Rastreamento

A nova norma do Ministério da Saúde estabelece que a mamografia deve ocorrer mediante decisão compartilhada entre paciente e médico, o que ainda gera dúvidas sobre possíveis negativas dos profissionais. “A decisão clínica compartilhada não está claramente difundida no Brasil”, afirma Santos Junior.

Ele defende que o país avance para um programa nacional de rastreamento ativo, onde as pacientes são convocadas pelo sistema de saúde. A inclusão formal das mulheres de 40 a 49 anos, segundo Matsumoto, deve diminuir as negativas, mas ainda dependerá da interpretação individual de cada profissional.

A nova faixa etária do exame também abrange mulheres de até 74 anos, exigindo continuidade, monitoramento e definição individualizada de riscos para essa idade. Para o presidente da Femama, a ampliação é um passo necessário, mas seu impacto real dependerá de um planejamento, financiamento e gestão eficientes. “As leis avançam, mas sua implementação depende de como decidimos investir nelas”, conclui.

Com informações de Metrópoles

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