Foto: Devin Oktar Yalkin/The New York Times

Nicolas Cage não tem medo de crescer. É um homem que canalizou a grandiosa atuação gestual dos filmes expressionistas alemães para “Feitiço da lua” (1987), e até mesmo a decisão de mudar seu nome — trocando o famoso sobrenome de sua família de cineastas pelo do super-herói Luke Cage — permitiu-lhe inventar uma mitologia pessoal alinhada às suas ambições.

— Eu queria que, quando pensassem em “Nick Cage”, as pessoas imaginassem algo um pouco imprevisível — diz. — Não vai ser o mesmo de sempre.

De alguma maneira, é isso o que o público percebe nele. E este Cage está de volta em “O homem dos sonhos”, lançado nos EUA semana passada pela A24, produzido por Ari Aster e escrito e dirigido por Kristoffer Borgli — e previsto para chegar ao Brasil em fevereiro de 2024.

Cage encarna Paul Matthews, um professor universitário que começa a aparecer nos sonhos das pessoas. Para Paul, o estrelato viral é inesperado, mas não totalmente indesejável. Ainda assim, uma vez que esses sonhos coletivos se transformam em pesadelos, o infeliz professor fica indefeso contra a reação pública.

— Este filme é uma análise interessante sobre a experiência da fama — diz Cage.

Como você foi parar em “O homem dos sonhos”?

Sou um grande admirador de Ari Aster. Queria trabalhar com ele e ele me enviou esse roteiro. Acho que tinham outros atores em mente, mas eu li e imediatamente respondi como poderia criar Paul Matthews.

E o que foi isso?

Usei todos os sentimentos que passei por volta de 2008, 2009, quando estupidamente pesquisei meu nome no Google e vi “Nicolas Cage Losing (It)”. Alguém escolheu cenas de pânico, fez uma montagem e aquilo se tornou viral. Fiquei confuso e frustrado. Pensei: “Talvez isso obrigue alguém a assistir ao filme real e ver como o personagem chegou àquele momento”, mas por outro lado, pensei: “Isso não era o que eu tinha em mente quando decidi me tornar um ator de cinema”. Tive essa sensação durante anos e, quando li “O homem dos sonhos”, pensei: “Agora posso fazer algo com esses sentimentos e aplicá-los a Paul Matthews”.

Ficou lisonjeado quando começou a experimentar a fama?

Comecei a atuar profissionalmente, acho, aos 15 anos. Não gostava de atuar em filmes por fama ou elogios, então nas primeiras vezes em que me pediram autógrafos, fiquei confuso. Quase senti vergonha de estar feliz por alguém querer meu autógrafo. O interessante é que não acordo de manhã e digo para mim mesmo: “Ah, sou famoso”. Mas já sei que não devo sair se não estiver de bom humor. Fico em casa. Não quero estragar o dia de ninguém porque estava de mau humor e não dei todos os autógrafos.

O desejo de ser reconhecido motiva muitas pessoas — até atores, acho. Ou não?

Se você quer ser famoso, ganhar dinheiro, um prêmio, tudo bem, mas isso só vai te levar até certo ponto. Claro, é bom ser reconhecido. Mas o objetivo de tudo é contar uma história e fazer com que ela se conecte ao público.

Como sobrinho de Francis Ford Coppola, você cresceu próximo à fama. Qual foi a sua impressão da fama antes de experimentá-la?

Lembro de uma vez ter ido a um teatro em São Francisco com meu tio. Enquanto ele caminhava pela rua, todos diziam: “Francis Coppola. Francis Coppola. Francis Coppola.” Eu pensei: “O.k., a fama é isso: as pessoas sussurram seu nome quando você passa”.

Você se identifica com a experiência de Paul indo a um restaurante, onde ele pode sentir que as pessoas estão olhando para ele e tentando tirar fotos secretas?

Eu não iria a um restaurante a menos que pudesse conhecer bem as pessoas e agradecer por elas terem gostado do filme. Estou confortável com isso agora, mas quando era novo tive que aprender como chegar lá.

As pessoas ficam ansiosas para usar seus telefones perto de Paul, na esperança de capturar um momento viral para ajudá-las a aproveitar sua notoriedade. Esse é um novo peso da fama.

E muito real. Aconteceram coisas comigo quando fui a um bar e não tinha ideia de que alguém estava me filmando… e isso vai para o TikTok. Logo pensei, “O.k., para mim chega”. Mas é um mundo novo. E essa é outra razão pela qual gosto deste filme: é relevante. É assim que as coisas são no século XXI. Não era assim quando Bogart fazia filmes.

Me pergunto se não estamos em direção a um ponto em que as pessoas dizem: “Olha, há muita informação em muitas cabeças o tempo todo”. O filme aborda esse tipo de subconsciente coletivo, mas o desejo de se desconectar dele às vezes parece avassalador.

Alan Moore, o grande romancista gráfico, disse que estamos indo para um lugar onde a informação será distribuída tão rápido que, eventualmente, nos tornaremos vapor. Mas a questão é que temos que evoluir, progredir. É assim que as coisas são e vão ficar. Estremeço ao pensar no que vem a seguir. Será um chip em nossos cérebros? Não sei. Mas seja o que for, estamos evoluindo e quero encontrar uma maneira de trabalhar com isso.

O que você guardou do tempo de protagonista de grandes sucessos?

Foi um sonho que se tornou realidade. Diziam: “Você não pode fazer isso. Você não se parece com um desses caras. O que faz você pensar que pode fazer isso?” Eu respondia: “Bem, sou um estudante e acho que posso tentar fazer sim e aprender algo com isso. Vai ser um desafio. Vamos ver se funciona.” Bem, talvez tenha funcionado um pouco bem demais.

Porém, algo que você não deseja fazer é interagir com as mídias sociais.

Não estou em nenhuma mídia social. Não quero tuitar, não quero estar no Instagram ou no TikTok. Isso ocorre principalmente porque sinto que essa é a única maneira de ficar perto de uma certa ideia da era de ouro do que um ator de cinema deveria ser, onde você não tinha tanto acesso. Jack Nicholson se recusava a participar de talk shows.

Mas você não tem medo de participar de talk shows.

Acho que os talk shows são uma ótima entrevista, porque você consegue captar o tom, consegue expressar as nuances. Você não precisa se preocupar se será mal interpretado. Esse agora é o perigo, caça-cliques: você diz uma coisa e aquilo se transforma em algo que você não disse, e de repente se torna a sua verdade. Não quero pisar em ovos e continuar me editando porque quero dar a vocês uma entrevista autêntica e quero que isso seja agradável para seus leitores. Mas sei que algo vai ser escolhido a dedo e remendado, e eles vão pegar e dizer que eu disse algo que não disse. Você imagina se John Lennon desse uma entrevista hoje, o que aconteceria?

Se você reler entrevistas de algumas décadas atrás, é surpreendente como as celebridades estavam dispostas a ser sinceras.

Acho que as pessoas gostam genuinamente de autenticidade, assim como sentem uma conexão com uma performance que lhes parece real. Vou optar por permanecer autêntico e não vou deixar que nos impeçam de ter uma conversa que seja de alguma forma estimulante. Não quero viver com medo disso.

Com informações de: O Globo 

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