Aysú acordou cedo, inquieta. Era domingo e chovia muito em Manaus. “O que foi?”, perguntou Caraíba. “Sonhei de novo com meus pais”, respondeu. “Odeio domingos, principalmente quando chove”. “No sonho eles estavam morrendo e eu não conseguia ajudá-los, por mais que eu tentasse”. “Saia da sacada, está frio aí”, disse acolhendo-a em seus braços.

Aysú refletiu um pouco e despois disse: “Você tem razão, não há de ser nada! Mas diga-me uma coisa. Você não acha que atualmente os adolescentes e os idosos passam por muitos problemas, principalmente problemas relacionados à convivência familiar?”. “Concordo contigo, mas a questão central é a seguinte: como ajudá-los?”, disse Caraíba.

“Venho observando que depois da pandemia de Covid-19 a vida dos adolescentes e dos idosos não têm sido fácil. Os problemas emocionais, que já eram muitos, se multiplicaram, principalmente os problemas relacionamentos a convivência familiar”, continuou Aysú.

“Você tem razão! Os processos emocionais e de aprendizagem se aceleraram; os adolescentes tiveram que aprender a lidar com problemas que antes eram diluídos ao longo do tempo”, refletiu Caraíba. “A percepção geral é que à vida se comprimiu!”, completou Aysú.

“Hoje tudo é muito rápido, passageiro; a comunicação é instantânea, os relacionamentos são passageiros, tudo é para ontem, nada dura para sempre”, disse Caraíba. “Hoje não se tem mais tempo para nada, principalmente para à convivência familiar”, completou Aysú.

“A tecnologia ajudou bastante nesse processo e a internet, as redes sociais, mudou para sempre à vida dos adolescentes com seus familiares, com os amigos, com a escola”, completou Caraíba. “Sim, isso mesmo! As tarefas domésticas, a conversa com os pais, com os parentes, os estudos, o trabalho, tudo precisou ser reconfigurado”, disse Aysú.

“Os adolescentes tiveram que aprender a lidar com sentimentos que antes eram imagináveis para eles. Agora, depois da pandemia, o que eles mais precisam é ser amados”. “E o que é ser amado?”, perguntou Yasú. “Ser amado significa ser respeitado em sua singularidade”, explicou Caraíba.

“Na convivência familiar, muitos idosos se sentem solitários e até abandonados dentro de suas próprias casas. Eles são a parte mais fraca desse processo, são os que mais sofrem. Muitos deles até morrem sozinhos de solidão, mesmo cercados de sobrinhos e netos”, completou Aysú.

“Às vezes, muitos idosos, por já ter pedido o companheiro ou a companheira e por não ter ninguém ao seu lado, com a mesma vivência, alguém para compartilhar suas dores e alegrias, preferem morrer a viver solitariamente; muitos, até, cometem suicídio”, disse Caraíba.

“Conviver com um idoso não é tarefa fácil, principalmente quando essa pessoa é totalmente depende de você”, disse Aysú. “Estatísticas apontam que o Brasil caminha a passos largos para ser um país com grande número de pessoas idosas”, completou. “Não é atoa que a profissão que mais cresce no Brasil é a de cuidador de idosos”, disse Caraíba.

Uma lágrima grossa escorreu do rosto de Aysú. “Diga-me o que você está sentido?”, perguntou Caraíba. “Que você é o amor da minha vida”, respondeu Aysú. Caraíba riu de felicidade. Ele tinha certeza que estava reconquistando a mãe dos seus filhos. Abraçados, Aysú riu também. Mas não foi um riso alheio. Foi um riso puro, inocente e apaixonado.

“E você, o que ver em mim?”, perguntou Aysú. “O doce do seu beijo, a força da sua fé e a pureza da tua alma”, respondeu Caraíba. E como um casal apaixonado, beijaram-se e amaram-se ali mesmo, indiferentes às falações maldosas dos vizinhos.

Luís Lemos é professor, filósofo, escritor, autor, entre outras obras de, O primeiro olhar A filosofia em contos amazônicos (2011), O homem religioso A jornada do ser humano em busca de Deus (2016), Jesus e Ajuricaba na terra das amazonas Histórias do universo amazônico (2019), Filhos da quarentena A esperança de viver novamente (2021)

Instagram: @luislemosescritor

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