A busca pelo conhecimento é algo inerente ao ser humano. Desde que o homem se entende por gente ele procura, incessantemente, saber o que se passa ao seu redor. Há uma sede inesgotável do homem por apreender a realidade que o cerca.
Por outro lado, quando nos debruçamos sobre a metodologia da pesquisa somos apresentados a 4 maneiras de conhecermos a realidade: o conhecimento empírico, o conhecimento filosófico, o conhecimento científico e o conhecimento teológico ou religioso. Alguns autores reconhecem ainda uma quinta modalidade: o conhecimento artístico, mas que vamos deixar de lado tendo em vista os propósitos deste opúsculo.
O conhecimento empírico talvez seja o mais elementar de todos eles. Ele provém das tarefas do cotidiano. Da necessidade de encontrar soluções no dia-a-dia. Um bom exemplo dessa modalidade de conhecimento é o conhecimento dos nossos ribeirinhos que, pela prática, aprenderam a colher na floresta alguns “medicamentos” para serem aplicados em algumas enfermidades. Seus inúmeros chás trazem alívio quase que imediato no momento da dor.
Na pesca não é diferente. O aprendizado passado de geração em geração ajuda a pescar mais e melhor.
Nossos ancestrais (homens da caverna) exploraram muito esse tipo de conhecimento.
Por outro lado, o conhecimento filosófico é aquele adquirido pelo uso da razão. Ele nasce e se desenvolve unicamente “dentro da cabeça” de quem o concebe. Aristóteles, Platão e tantos outros filósofos alargaram as fronteiras do conhecimento humano recorrendo unicamente ao uso da razão e da lógica.
O conhecimento científico, por sua vez, é o conhecimento evidenciado. O conhecimento produzido em laboratórios – sejam aqueles representados por tubos de ensaio ou por meio das pesquisas de campo produzidas pelas ciências sociais numa rodada de conversas dirigidas por um observador participante. Em razão dos diversos protocolos cumpridos até sua produção final, o conhecimento científico talvez seja o “mais respeitado” de todos.
Por fim, o conhecimento teológico ou religioso nasce a partir da relação do homem com o divino. No passado, o divino era representado pela chuva, pela lua, pelo sol, pelas estrelas ou pelos fenômenos naturais, como os eclipses. Com o passar do tempo a humanidade foi construindo concepções mais “personificadas” do divino. Paulatinamente, foram surgindo personagens que avocavam para si essa condição. Jesus Cristo, Buda, Zoroastro e Maomé foram alguns desses expoentes.
Note que cada modalidade de conhecimento vê e recolhe fragmentos da realidade de uma forma diferente. Parece que a realidade é algo tão grande que ela é incapaz de ser apreendida apenas por uma única delas. Ela parece exigir diferentes abordagens para se mostrar. Ou seja, a realidade é muito maior que cada modalidade de conhecimento considerada individualmente. Nesse sentido, parece ingênuo de nossa parte achar que uma única forma de conhecer a realidade que nos cerca seria capaz de apreendê-la e expressá-la em toda a sua integralidade. Ao que tudo indica, cada modalidade de conhecimento depende de outra para complementá-la e, assim, juntas, são capazes de expressá-la com mais riquezas de detalhe.
Pois bem.
Muitos cientistas que se dizem ateus parecem cometer esse equívoco. Ao tentarem explicar a realidade que nos cerca recorrendo unicamente a fórmulas matemáticas que esclarecem, por meio de causas e efeitos, muitos fenômenos naturais, assemelham-se a um pescador que procura capturar todos os peixes dos oceanos lançando apenas uma única rede de pescar. Convenhamos: há outras formas de capturar peixes que não sejam por meio de redes de pescar.
Há um paralelo que costumo fazer sempre que a realidade se expressa por meio de laços com o divino.
Cinco são os sentidos: a visão, o tato, o olfato, a audição e o paladar. Cada sentido captura um fragmento da realidade sentida. Há realidades que só são percebidas pelos olhos (visão). Outras, pelo ouvido (as auditivas). Existem aquelas que chegam até nós tão-somente pelo tato (o toque) ou pelo paladar (degustação) ou, ainda, pelo olfato (o cheiro).
A existência de cinco formas de sentir a realidade que nos cerca nos ensina que ela (a realidade) não pode ser capturada apenas por uma delas. Insisto em dizer: é como se tentássemos pescar todos os peixes do oceano lançando a rede apenas uma única vez.
Mas há algo peculiar por trás dos sentidos. Eles nos revelam verdades muito mais profundas.
Exemplificativamente: por meio dos olhos percebemos uma parte da realidade. Para eles – os olhos – existe tão-somente uma única realidade: aquela percebida pela visão. Os olhos são incapazes de capturarem o odor (o olfato), os sons (a audição), a textura dos materiais (o tato) e o gosto dos alimentos (paladar). Se os olhos pudessem se comunicar conosco e, de uma hora para outra, afirmassem que não existe nada além das cores ou da claridade ou escuridão eles estariam indubitavelmente certos. Mas essa certeza seria relativa, pois consideraria apenas a realidade capaz de ser capturada por eles. Não abrangeria a realidade capturada pelo ouvido, pelo nariz ou pelos demais sentidos.
Essa mesma afirmação poderia ser manifestada por cada um dos sentidos. O ouvido poderia sustentar que não existe nada além dos sons. O nariz, por sua vez, afirmaria, com todas as honras, que não existe nada que vá além dos odores e, assim, sucessivamente.
Todas essas afirmações, porém – individualmente consideradas – expressaria apenas uma realidade relativa. Não absoluta, pois seriam incapazes de abranger a totalidade da realidade sentida. Esta é muito maior que cada sentido considerado individualmente.
Em suma. Quando os cientistas que se dizem ateus afirmam que Deus não existe – com base apenas na realidade que eles experienciam -, de uma certa forma, eles estão certos. Porém, é preciso considerarmos que a realidade pode ser capturada não apenas pelas fórmulas matemáticas ou por tubos de ensaio. Pensar assim, seria ingênuo. Um grande engodo. Cada uma das demais formas de conhecimento admitidas (filosófico, teológico ou religioso, empírico) também resgatam partes da realidade, justamente aquelas incapazes de serem apreendidas pelo conhecimento científico.
Cada forma de conhecimento é como uma antena que captura uma frequência única e específica. O fato, porém, de essa antena capturar uma única frequência, não nos autoriza a afirmar que não existam outras faixas de frequência. Se assim fosse, só existiria uma única estação de rádio ou de TV. A realidade, portanto, é muito maior que nossa forma de concebê-la.
E não nos esqueçamos: admitir que a realidade pode ser apreendida apenas por uma modalidade de conhecimento, é a mesma forma que acharmos que podemos pescar todos os peixes dos oceanos lançando apenas uma única rede.
Alipio Reis Firmo Filho
Conselheiro Substituto – TCE/AM