
O conselheiro tribal dos Marubo, povo indígena que habita o Vale do Javari, no Amazonas, ajuizou uma ação milionária contra o jornal norte-americano The New York Times (NYT) por danos morais e difamação. O processo, protocolado em um tribunal de Los Angeles, acusa o veículo de retratar a comunidade — composta por cerca de 2 mil pessoas — de forma ofensiva, como “viciada em pornografia” após a chegada da internet em seu território. Os Marubo pedem uma indenização de ao menos US$ 180 milhões, valor equivalente a cerca de R$ 1 bilhão.
A reportagem que motivou a ação foi publicada pelo NYT em 19 de julho de 2024, com assinatura do jornalista Jack Nicas. O texto abordava os impactos do acesso à internet via satélite — fornecida pela Starlink, empresa do bilionário Elon Musk — nas dinâmicas sociais da aldeia. Segundo o processo, porém, a matéria ultrapassou o limite do jornalismo informativo ao apresentar os Marubo como uma comunidade fragilizada, incapaz de lidar com o uso de tecnologia e profundamente afetada moral e socialmente pela exposição online.
“Essas declarações não eram apenas inflamatórias, mas transmitiam ao leitor comum que o povo Marubo havia decaído moral e socialmente, como resultado direto do acesso à internet”, aponta a petição, segundo trecho reproduzido pelo jornal The Guardian.
Além do NYT, a ação também responsabiliza os portais TMZ e Yahoo, acusando-os de sensacionalismo e amplificação indevida da reportagem original, o que teria intensificado a difamação contra os indígenas.
“Ataque ao caráter de um povo”
No processo, os Marubo afirmam que a reportagem sugeriu que “a juventude foi consumida pela pornografia” e que os indígenas estariam viciados em redes sociais, videogames violentos e mensagens cheias de fofoca. Segundo os advogados que representam o povo indígena, a matéria desrespeita a moralidade cultural dos Marubo, uma vez que a comunidade desaprova até mesmo demonstrações públicas de afeto, como beijos.
“Trata-se de um ataque direto ao caráter, à moralidade e à posição social de todo um povo, sugerindo que lhes faltam a disciplina ou os valores necessários para atuar no mundo moderno”, diz outro trecho da ação.
Contexto e impacto
A chegada da internet à região, viabilizada por tecnologia da Starlink, foi apresentada pelo NYT como um divisor de águas na vida dos Marubo. O jornal listou problemas como exposição a conteúdos impróprios, fraudes virtuais, vícios digitais e conflitos gerados por novas formas de comunicação. Para a comunidade indígena, contudo, a narrativa reforça estereótipos coloniais e ignora a complexidade cultural do grupo.
A ação judicial levanta questionamentos sobre a responsabilidade de grandes veículos internacionais ao cobrir comunidades tradicionais, especialmente quando o conteúdo pode provocar danos duradouros à imagem pública e à dignidade coletiva de povos indígenas.
Até o momento, o New York Times não se manifestou sobre o processo.







