Passei duas semanas no mais doce e absoluto sócio. Duvidoso privilégio conferido pela idade. Li muito, enquanto, vez por outra, sorvia o meu Red Label. E ouvi Mozart. Ia dizendo “até cansar”. Acontece que é impossível sentir fadiga, ouvindo, por exemplo, os acordes da sonata número 1, para violino e piano, em mi bemol. Coisa de gênio e, por isso, indescritível. De passagem, minha filha Lucíola me pergunta se eu sei quem está no paredão. Olhei-a e dei uma cachimbada mais profunda, sem lhe dar resposta. Só podia estar tirando sarro do velho pai. Mas aí ela me explica que no tal de Big Brother está uma amazonense, que é cunhã poranga do Garantido. Deve uma ser uma moça bonita e, com certeza, merece melhor sorte do que participar dessa insanidade com que a Globo anualmente engana milhões de brasileiros, proporcionando-lhes um espetáculo idiota e de quinta categoria.

Mas deu também para ver algumas outras coisas assaz curiosas. Seria impossível perder o circo a céu aberto que se implantou na avenida Paulista, no 25 de fevereiro. Magno Malta, um senador que, normalmente, já não revela muita intimidade com o idioma, não conseguia articular duas palavras e por pouco não cai do palanque. Disseram-me depois que Sua Excelência tinha abusado um pouco da hospitalidade de Baco e ido além da conta no consumo do que lhe era oferecido. Estava de matar de lenço.

Malafaia não conseguia conter a histeria. Sobre os democratas lançou todas as imprecações que sua verbosidade permite, ameaçando-os com padecimentos que fariam inveja aos habitantes dos círculos dantescos do inferno. Para os que considera suas ovelhas reservou as bênçãos e as benesses oriundas de um deus só dele conhecido. A promessa, como sempre, era a de que receberão os regalos divinos, desde que não caiam na besteira de esquecer o pagamento do dízimo. Afinal, sem essa contrapartida profana e material, o santo homem não poderia viver à tripa forra.

Michelle estava perfeita no papel de “mater dolorosa”. Exalando pretensas virtudes conjugais, a dama alardeava as qualidades de seu cara-metade, sobre o qual dizia estarem caindo as mais atrozes perseguições. Nenhuma alusão aos momentos em que ele zombava das vítimas da epidemia, imitando grotescamente alguém com falta de ar. Muito menos àquela ocasião em que o inelegível sentiu estar “pintando um clima”, quando se deparou com adolescentes venezuelanas.

Bolsonaro, por óbvio e até por ser o dono do picadeiro, foi o ponto alto da exibição. Seu discurso me fez lembrar a Ismália, de Alphonsus de Guimaraens. Desvairada, a moça se lança do alto da torre, depois de desejar possuir tanto a lua que via no céu, como a que se refletia no mar. Assim está a loucura do ex-presidente. Clama por anistia para um crime que nega ter cometido. Negativa, aliás, absolutamente inócua porque a investigação em curso está conduzindo ao resultado por todos previsto: era ele em pessoa que estava no comando das articulações golpistas. Buscava solapar a ordem democrática para implantar nova ditadura em que a terra seria plana e a tortura, meio de prova.

Na plateia do circo, não houve só pipoca e refrigerante. O divertimento ia além. Eram vários idiotas portando uma bandeira de Israel, ofensiva, aliás, àquele Estado, na medida em que a estrela de David foi estropiada, amputando-se-lhe uma das pontas. Vi uma senhora, cuja idade recomendava um pouco mais de recato, explicar que portava a bandeira porque “Israel é um país cristão”, religião por ela também abraçada. Diante de uma estupidez desse tipo, é impossível contrapor qualquer argumento. Só assim se justifica a passividade diante do genocídio de Gaza.

Não se sabe até agora o que efetivamente buscavam os produtores e atores daquela tragicomédia. Tenho para mim que o objetivo era bem singelo: manter vivo o discurso de ódio, alimentando a chama de um inconformismo, tão irracional quanto pernicioso. Urge que eles sejam contidos.

P.S – Acabo de saber que o deputado Nikolas Chupeta (ou Peruca) foi eleito presidente da Comissão de Educação da Câmara. Vou começar a pleitear minha nomeação para a presidência do Comitê Nacional de Energia Nuclear.                  

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