Ricardo Stoppe Junior (Foto: Reprodução)

A Polícia Federal interceptou conversas do empresário Ricardo Stoppe Junior, um dos donos do grupo Ituxi, que negociava no Amazonas tratando de supostos pagamentos de propina a funcionários públicos federais e estaduais no Amazonas para viabilizar a grilagem de terras e a falsificação de dados em cartórios. As informações constam em um relatório da PF, obtido pelo O GLOBO.

No relatório, os investigadores apontam que o tal “combinado” se refere “a pagamento de propina”. Eles destacam uma movimentação em dinheiro vivo de R$ 139 mil feita em “período temporal de diversas fraudes relacionadas a grilagem de terras pela organização criminosa”, conforme o texto.

“Aí o superintendente (Incra Amazonas) vai analisar, que é o combinado, e posterior devolver ele autorizando a fazer. (…) E aí envia pro superintendente pra ele mandar fazer o ofício”, diz ele em diálogo datado de outubro de 2022. Um dos envolvidos é um ex-superintendente do Incra do Amazonas que estava no cargo até fevereiro de 2023.

“Eu tô precisando mais de dinheiro aí porque eu prometi já o Carlão, o Carlão vai andar rápido”, disse Stoppe em outro áudio captado em maio de 2022.

Conforme a PF, “Carlão” seria um servidor do Incra que recebia o dinheiro por meio de uma empresa de fachada do filho, que movimentou R$ 5,5 milhões em três anos em operações consideradas “atípicas pelo Coaf”.

“Eu tinha dado aqueles cem que o senhor mandou, (…) ele quer mais cem mil pra entregar o documento. Falou que o secretário tá puto, não queria mais dar”, diz um sócio de Stoppe em uma conversa captada em agosto de 2022.

Em outra gravação de março daquele ano, o empresário fala sobre resolver um “rolo” dando dinheiro “lá em cima em Manaus”.

Na decisão que autorizou a sua prisão, a Justiça Federal do Amazonas destacou uma conversa de Stoppe na qual ele diz que já remeteu dinheiro ao Incra, Ipaam e “tudo quanto é canto”.

“Fora o que eu tô dando de dinheiro com tudo aí pra arcar com isso, uma coisa que não tem documento. (…) Já foi dinheiro em órgão, já foi dinheiro em Incra, já foi dinheiro em Ipaam, já foi em tudo quanto é canto e nada (…) A gente tem que dar um ponto final nisso, porque eu tô documentando uma coisa que, pelo jeito, não existe, né”, disse ele em um diálogo de julho de 2022.

Preso preventivamente desde o início de junho, Ricardo Stoppe Junior é apontado pela PF como líder de um suposto esquema de fraudes na comercialização de R$ 180 milhões de créditos de carbono com lastro em terras da União griladas no Amazonas.

De acordo com a PF Ricardo Stoppee foi “um dos protagonistas” da COP 28, em Dubai, em dezembro de 2023.

Por meio de certificados fraudulentos e inserção de dados falsos em registros de cartórios e órgãos públicos, o grupo liderado por Stoppe Júnior teria se apropriado ilegalmente de terrenos na Amazônia que totalizam 537 mil hectares, equivalente ao território do Distrito Federal.

Segundo a PF, com essas áreas o grupo lucrava com a venda do crédito de carbono, valor pago por empresas privadas pelas emissões que deixam de ser lançadas.

Os investigadores identificaram supostos pagamentos ilícitos a pelo menos dez servidores públicos do Incra, Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) e Secretaria de Estado das Cidades e Territórios do governo do Amazonas. 

Em nota, o Incra informou que vem auxiliando as investigações.

Já o governo do Amazonas afirmou que “não compactua com nenhum tipo de desvio de conduta e ilícitos cometidos” e que as pessoas citadas não fazem mais parte da administração estadual.

A defesa de Stoppe não quis se manifestar.

O grupo do qual ele é sócio publicou uma nota afirmando que os créditos de carbono “sempre foram certificados pelo mercado por manterem a qualidade e integridade esperadas”.   

Outro servidor do Incra, que coordenava a área de certificação, é apontado como o responsável por emitir documentos fundiários fraudulentos ao grupo empresarial e “atuou dentro do Incra como peça fundamental para a organização criminosa”, segundo a PF.

Dos quadros do governo do Amazonas, há dois ex-secretários e outros três ex-servidores da Secretaria de Estado das Cidades e Territórios (Sect) sob investigação. Segundo a PF, eles montaram um “balcão de negócios” no órgão.

Um dos ex-secretários seria beneficiário de um repasse de R$ 200 mil para a liberação de documentos ao grupo.

No inquérito, a PF estimou o dano ambiental provocado pelos alvos a um total de R$ 606 milhões.

Segundo os investigadores, além da grilagem, o grupo utilizava as propriedades para fazer “lavagem de madeira” – ou seja, emitiam documento de toras retiradas de áreas proibidas, como reservas indígenas, para a comercializarem no mercado legal.

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