A tese foi fixada pelo Supremo no julgamento de ações protocoladas pela Abraji e pela ABI - (crédito: Antonio Augusto/SCO/STF)

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por maioria, que o assédio judicial contra jornalistas não encontra respaldo na Constituição. Esta prática envolve a abertura de diversos processos com o intuito de censurar e perseguir profissionais da imprensa. A decisão foi tomada em julgamento de duas ações apresentadas pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI).

O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, lembrou que, embora a imprensa possa cometer erros graves, como no caso da Escola Base de São Paulo em 1994, onde reportagens falhas acusaram injustamente professores e donos da instituição de abuso sexual contra crianças, a Justiça deve intervir somente em casos de “culpa grave”. Barroso destacou que o uso do Poder Judiciário não deve ser banalizado para provocar censura de jornalistas.

Por outro lado, o ministro Flávio Dino apresentou uma opinião divergente, argumentando que não se deveria criar uma classe com direitos mais protegidos do que outras. “Por que a responsabilidade civil do jornalista é diferente da do professor?”, questionou Dino. O ministro Edson Fachin rebateu: “Porque estamos julgando à luz da Constituição, e não o contrário”.

A ministra Cármen Lúcia enfatizou que o trabalho da imprensa é protegido pela Constituição e que, em uma democracia, a Justiça não pode ser usada para impedir a atividade jornalística. “Há novas formas de censura. Estamos falando de liberdade, e esse tipo de julgamento é o que está na pauta. Jornalistas são perseguidos por cumprir suas funções, função essa importantíssima para a prática da democracia”, afirmou Cármen Lúcia.

Ela também ressaltou que a liberdade de expressão deve ser protegida, mesmo quando exercida nas redes sociais e com conteúdo crítico. “A falta de respeito na época de falar contra mim nunca respeitou os umbrais da porta de casa. Não é por isso que fico contra a liberdade de imprensa, seja qual for a rotulação, mesmo nas redes sociais. Continuo dizendo que é melhor viver isso com liberdade do que se vivia na década de 70”, disse.

O advogado da ABI, Cláudio Pereira de Souza Neto, comemorou a decisão e destacou o avanço na proteção da liberdade de imprensa. “A Corte decidiu que, para que um jornalista seja responsabilizado civilmente, não basta que a informação divulgada seja falsa. É necessário comprovar que o jornalista agiu, de modo inequívoco, com dolo ou culpa grave”, afirmou Souza Neto. Ele observou que a decisão se inspira na jurisprudência da Suprema Corte norte-americana, que visa evitar que a responsabilização civil de jornalistas produza um efeito resfriador no debate público.

Bruno Moura, advogado e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), concorda com o avanço trazido pela decisão. No entanto, ele alertou que a tese do julgamento deixou espaço para que algumas situações de assédio judicial continuem ocorrendo. “A decisão vem em boa hora e mostra que o Supremo se preocupa com a proteção da liberdade de imprensa e de expressão. Porém, o assédio judicial não se resume ao ajuizamento de um número elevado de ações. Ele é mais complexo e, provavelmente, em um futuro próximo, a Corte voltará a enfrentar essa temática para aperfeiçoar os instrumentos jurídicos contra os ilícitos de ações judiciais para cercear o jornalismo”, destacou Moura.

A decisão do STF marca uma vitória significativa para a liberdade de imprensa no Brasil, garantindo que jornalistas possam exercer sua função crítica e investigativa sem medo de retaliações judiciais injustificadas.

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