
Pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) identificaram uma toxina presente no veneno do sapo Brachycephalus ephippium, nativo da Mata Atlântica, com alto potencial para o desenvolvimento de medicamentos voltados à prevenção e ao tratamento de doenças cardiovasculares, como hipertensão arterial, disfunções endoteliais e até acidente vascular cerebral (AVC).
A descoberta foi publicada no último dia 19 de junho no European Journal of Pharmacology, como parte de um estudo internacional que envolve cientistas do Brasil, Dinamarca, Portugal e Venezuela — com destaque para a colaboração da Universidade de Aarhus, na Dinamarca.
Molécula promissora
A substância, batizada de BPP-BrachyNH₂, foi inicialmente identificada em 2015 durante uma expedição científica. Desde então, tem sido analisada por seu potencial terapêutico. Os estudos mais recentes demonstraram que o composto possui efeito vasodilatador semelhante ao de medicamentos já utilizados no tratamento da hipertensão.
“Sintetizamos essa molécula e vimos o potencial protetor cardiovascular. Estou muito empolgado porque é uma substância relativamente fácil de produzir”, afirma José Roberto Leite, professor da Faculdade de Medicina da UnB e coordenador do projeto.
O Brachycephalus ephippium é um sapo de pequeno porte, medindo entre 1,25 cm e 1,97 cm, e se destaca pela coloração alaranjada ou amarela-cromo. Ele é amplamente encontrado nas regiões da Serra do Mar e da Serra da Mantiqueira, dentro do bioma da Mata Atlântica.
Como atua no sistema cardiovascular
Nos testes realizados em ratos, a toxina mostrou capacidade de promover relaxamento dos vasos sanguíneos, especialmente em artérias mesentéricas, que fornecem sangue aos órgãos digestivos. O efeito ocorre por meio da ativação da enzima argininosuccinato sintase (AsS), essencial para a produção de óxido nítrico — substância naturalmente vasodilatadora no corpo humano.
Essa ação resulta no aumento da L-arginina, que atua como substrato para o óxido nítrico, ajudando a manter o tônus vascular, regular a pressão arterial e prevenir eventos isquêmicos, como o AVC.
Além disso, os pesquisadores observaram efeitos protetores sobre o endotélio, camada interna dos vasos sanguíneos frequentemente afetada em doenças cardiovasculares. Segundo Leite, esses resultados ampliam o potencial da toxina como agente terapêutico.
Do laboratório para a clínica
Com os resultados positivos em modelos animais, o grupo se prepara agora para iniciar ensaios clínicos em humanos. O objetivo é testar a eficácia e a segurança da substância em tratamentos de pacientes.
“Nossos testes já comprovaram a eficácia em animais. Agora, vamos partir para humanos. Para isso, precisamos de financiamento e apoio institucional”, explica o coordenador.
No Brasil, o projeto conta com a participação de pesquisadores da UnB, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), do Instituto Federal do Piauí (IFPI), da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.
Doenças cardiovasculares: um problema de saúde global
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no mundo. No Brasil, cerca de 380 mil pessoas morrem anualmente em decorrência dessas enfermidades, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). As principais condições incluem infarto, AVC, insuficiência cardíaca, arritmias e doenças arteriais.
Muitas dessas doenças evoluem de forma silenciosa, sendo detectadas apenas quando já estão em estágio avançado. Sintomas como dor no peito, falta de ar, fadiga, tontura e inchaços são sinais de alerta que não devem ser ignorados.
A descoberta da BPP-BrachyNH₂ representa, portanto, um importante passo em direção a tratamentos mais eficazes, naturais e de fácil produção contra um dos maiores problemas de saúde pública da atualidade.
Com informações de Metrópoles







