Marcus Phillipe

Debatendo questões atuais sobre os impactos das diversas crises vividas pela sociedade e suas consequências para a democracia e suas instituições, a Escola Superior da Magistratura do Amazonas (Esmam) realizou, na sexta-feira (21/06), no Auditório Anexo do TJAM, o seminário “Democracia e Instituições: crises e desafios”. O evento ocorreu na modalidade presencial, com carga horária de 4h/aula, voltado para magistrados, servidores, estudantes e operadores do direito.

Na abertura do evento, o diretor da Esmam, desembargador Flávio Humberto Pascarelli Lopes, outorgou à ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Edilene Lobo, a Medalha do Mérito Acadêmico. Na sequência ocorreram as palestras “Crise Democrática e função do Judiciário”, feita pelo professor Georges Abboud e “Direitos Fundamentais e Inteligência Artificial: desafios e perspectivas na sociedade hiperconectada”, com a magistrada Edilene.

Segundo o diretor da Esmam, desembargador Flávio Pascarelli a escola teve neste seminário dois grandes momentos: o primeiro com as palestras da ministra e do professor Georges Abbud, que trataram de um assunto essencial para o estado brasileiro e para o mundo, que é a democracia e seus desafios. “Nós vivemos numa verdadeira crise, a democracia é atacada todos os dias, e é bom que se fale sobre isso, também é necessário que quem fale sobre isso seja muito bom, como é o caso no dia de hoje”, pontuou Pascarelli. O segundo grande momento, destacou o diretor da Esmam, foi o lançamento de quatro importantes obras de autores locais com relevantes contribuições para o Judiciário.

A ministra do TSE, Edilene Lôbo, concedeu entrevista antes do evento e declarou estar muto entusiasmada em participar do seminário. “É uma alegria estar aqui, queria aproveitar para cumprimentar cada um, cada uma, cumprimentar a presidente do Tribunal, as juízas, os juízes que integram o Judiciário Estadual e Federal e dizer da minha honra de estar aqui hoje para receber essa medalha, principalmente muito grata pela honraria. E o modo que eu posso retribuir essa honraria, essa confiança, é compartilhar um pouco dos meus escritos e reflexões sobre mundo digital, desafio das democracias contemporâneas e, principalmente, voltado ao processo eleitoral brasileiro, refletir sobre o impacto dessa nova arena comunicacional digital. O ponto central que é importante nós refletirmos é de realçar, colocar a pessoa humana no centro de gravidade de qualquer inovação tecnológica. A pessoa humana como o destaque de qualquer invento, de qualquer engenharia, de qualquer criação. Então a ideia é essa. A tecnologia, a inteligência artificial é muito bem-vinda para oferecer facilidades, para propiciar progresso, mas no ponto em que atinge os direitos fundamentais, nós precisamos estar atentos e, principalmente, dizer que essas ferramentas, essas novidades têm que casar com os objetivos da humanidade, com a ideia de uma proteção do ser, com a ideia de permitir durante os processos eleitorais, por exemplo, a prevalência da verdade, da confiança”, afirmou a ministra.

Em relação à questão das novas tecnologias e as eleições que se aproximam, a ministra declarou que “temos de fato, olhando para trás, do mesmo modo que vemos um avançar da tecnologia sobre os processos políticos, eu também observo um avançar das estratégias de enfrentamento de dois problemas graves, que é a desinformação, cujo objetivo fundamentalmente é minar a confiança no sistema político eleitoral, e o discurso de ódio, que pretende excluir particularmente grupos numéricos minorizados, no Brasil. Então o que eu posso dizer, o que eu observo, seja da regulação produzida pelo TSE, seja das decisões frequentes do TSE, seja da preparação do seu corpo técnico, de juízes, juízas, promotores, promotoras, seja da criação de organismos importantes, eu diria estratégicos para lidar com essas duas disfuncionalidades, fundamentalmente a desinformação, a sensação que eu tenho é de confiança, é de crença que nós vivemos outros tempos e que a despeito desse aumento da desinformação, inclusive de novas práticas como as deepfakes, que são espécie de fake news, a despeito disso eu observo primeiro as pessoas mais preparadas, mais compreendendo o que é desinformação, as pessoas mais interessadas nos processos políticos. E outra coisa importante, a sociedade brasileira cada vez mais rejeitando essa ideia de comunicação violenta, de enfrentamento de problemas comuns pela briga, pela guerra. O meu sentimento é que nós vamos enfrentar um resultado muito profícuo nas eleições de 2024”, finalizou Lôbo.

Professor doutor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Georges Abboud afirmou que ser um grande prazer estar mais uma vez na Escola da Magistratura do Estado do Amazonas, desta vez para tratar sobre a questão da crise democrática e a função do Poder Judiciário. “A minha ideia é fazer uma evolução histórica de demonstrar como o Judiciário foi o último poder a se tornar independente e na primeira Constituição que a Independência Judicial aparece, que é a Constituição da República de Weimar, permanência ou a derrocada do Judiciário é um ponto fundamental para a manutenção ou queda da democracia. Então, a minha ideia é abordar essa evolução histórica na perspectiva do direito constitucional para tratar atualmente como a manutenção do Judiciário independente é o esteio crucial de um funcionamento sadio de uma democracia constitucional”, disse Abboud.

Lançamentos

Logo após as palestras, ocorreu o lançamento de quatro obras de autores amazonenses, operadores do Direito.

João Paulo Jacob, secretário-geral e executivo da Esmam e Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo-USP, lançou o livro “O Recall Eleitoral na Perspectiva Constitucional Brasileira”. “O recall é uma forma de responsabilização do mandatário, do detentor do poder executivo. É uma forma da população voltar a votar em caso de não cumprimento do programa de governo, em caso de grave desconfiança. É uma medida mais democrática do que o impeachment, porque os próprios cidadãos, o próprio povo é chamado a votar para decidir se aquele político continua no poder ou se ele sai do poder e convoca novas eleições”, explicou Jacob.

Defensor Público do Amazonas, Maurilio Casas Maia escreveu a obra “Defensoria Pública e a defesa constitucional de grupos sociais vulneráveis”, (editora Tirant, 2024), em parceria com e Adolfo Filgueiras Etienne. Segundo Maurílio. Segundo ele, “o livro pretende servir de ferramenta aos profissionais do Direito – em especial juízes, pesquisadores e defensores públicos, para reforço jurídico da proteção das mais vulneráveis pessoas de nossa sociedade, sempre à luz da Constituição e das Leis”.

A terceira publicação lançada no evento foi “Acesso à Justiça na Amazônia – Desafios e Perspectivas à Luz do neoconstitucionalismo”, do juiz do Tribunal de Justiça do Amazonas, Roger Luiz Paz de Almeida. “Esses estudos, essas análises que eu fiz no levantamento entre 2010 e 2016 foram frutos da minha própria experiência como magistrado no interior. Principalmente nas áreas de Envira, Eirunepé e Itamaraty. São municípios muito isolados em que a gente tem o aspecto da incompletude do sistema de justiça, como falta e ausência de advogados, do Ministério Público, de conselho tutelar, até da própria polícia civil e militar, circunstancialmente a gente tem a ausência desses profissionais. Então, eu como operador do direito, como pesquisador, acabei me debruçando sobre essa realidade, sobre essas adversidades tanto de transmissão de dados, internet, falta de estruturação estatal, tanto do Poder Executivo quanto do Poder Judiciário, porque são áreas isoladas”, salientou Roger Paz

Para o magistrado, o desafio foi justamente criar soluções dentro da sistemática do direito, “através dessas premissas epistemológicas, acadêmicas e científicas, de conceitos mais abertos, fruto dessa nova visão pós-positivista, para que pudéssemos justificar, fundamentar e instrumentalizar necessidades tanto da parte dessas comunidades que vivem isoladas, que são os ribeirinhos, desse contexto socioambiental, desestrutural, e que nós pudéssemos potencializar o acesso à justiça sem cometer ilegalidades ou sem descumprir a legislação. Então, justificar o aprimoramento de algumas práticas no interior, dentro desse ambiente de extrema diversidade, para que o trabalho do magistrado, para que o poder judiciário pudesse cumprir com a efetividade de princípios constitucionais, de garantias constitucionais e de princípios da nossa carta, mesmo nesses ambientes de isolamento geográfico”, explicou o magistrado.

“A comissão da mulher advogada da OAB Amazonas e o amparo às vítimas de Violência Doméstica”, de Adriana Lo Presti Mendonça, foi outra obra lançada na tarde de sexta-feira, no evento promovido pela Esmam.

“O livro intitulado ‘A Comissão da Mulher Advogada da OAB Amazonas e o amparo às vítimas de violência doméstica: um levantamento de dados no Sistema de Justiça do Amazonas’, procura avaliar importantes questões que permeiam a temática, sem deixar de levar em conta que adentrar no mundo para além das paredes domésticas exige ousadia, porque, na maioria das vezes, significa destoar dos padrões adequados às mulheres, advindo daí a irreverência de algumas que, mesmo cercadas de relações familiares tradicionais, mesmo frequentemente censuradas e tolhidas, procuram traçar novos rumos e definir seus destinos, apesar da violência que deixa hematomas e ameaças que as levam a pedir ajuda, por trás das quais pode haver risco real e iminente de abusos físicos e psicológicos e até mesmo de homicídio, ainda mais para as mulheres no Amazonas que sofrem com várias interseccionalidades. O estudo faz uma abordagem sobre o trabalho realizado pela Comissão da Mulher Advogada da OAB Amazonas no enfrentamento da violência doméstica, através de uma abordagem e pesquisa empírica no Sistema de Justiça do Amazonas”, comentou Lo Presti.

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