Felix Valois

O dólar disparou, a energia subiu, os impostos aumentaram e o salário estagnou. Como estamos vivendo? Ou seria melhor perguntar: onde estamos vivendo? O país está à deriva. Num oceano de incompetências e irresponsabilidades, a nau segue sem rumo, ausente o capitão. O comandante (ou a comandanta, como ela talvez prefira ser chamada) não diz a que veio e até parece se divertir com a perplexidade dos passageiros, que assistem atônitos ao imenso festival de besteiras. Os absurdos se sucedem numa escala alucinante. Do estelionato no mensalão à roubalheira na Petrobrás, tudo é sórdido, malcheiroso e repugnante. Um Congresso atabalhoado não consegue traçar uma linha de conduta que permita inferir estar buscando alguma solução para a balbúrdia geral.

Muito ao contrário. Fisiológicos, os parlamentares estão mais interessados na manutenção de privilégios pessoais, à cata de cargos e prebendas, sem dar a mínima para as angústias de duzentas milhões de pessoas. Há exceções, é claro. Ou não haveria a regra. Mas tão tímidas e acanhadas que suas vozes, quando se conseguem fazer ouvir, soam mais como lamento que como protesto ou insatisfação. Tudo porque uma camarilha, travestida de partido político, tomou o poder há mais de uma década e resolveu transformar as instituições da República em estatuto de organização paroquial, funcionando apenas nos e para os interesses dos integrantes da fechadíssima grei.

Outro dia um neto me disse: “Vô, eu só ouço falar em crise”. E arrematou com a pergunta que eu temia: “O que é isso?” Fiquei olhando para ele e matutando comigo mesmo: o que posso eu dizer para essa criança sem que ela pense que estou no mais alto grau de caduquice, hoje elegantemente rebatizada como mal de Alzheimer? Acuado, encarei e arrisquei: crise é quando uma pessoa não consegue resolver seus próprios problemas. Resposta chocha, com indiscutíveis traços de idiotice dilmal, mas foi o que me ocorreu na ocasião. O curumim me olhou meio desconfiado e concluiu: “Bom. Então pelo menos eu não estou em crise porque ainda hoje, na escola, consegui resolver todos os problemas de matemática”. E partiu para o videogame, para meu descanso e tranquilidade, já pensando que se o questionário prosseguisse e se aprofundasse, eu estaria irremediavelmente perdido.

Não dá, de fato, para entender (e muito menos explicar) o ponto a que o partido governista logrou conduzir o país. Sei que a ciência econômica acena para um problema global, buscando situar a questão nas dificuldades do próprio sistema capitalista e suas intrincadas relações financeiras. Que seja. Mas será que não dava para atuar com mecanismos preventivos? Será que ninguém no governo estava apto a, conhecendo as premissas, estabelecer conclusões lógicas? Se disso se trata, cuido que a tal crise pode perfeitamente ser alcunhada de “incompetência”. E, em sendo incompetência, não serão os mesmos que dela padecem que poderão encontrar remédios eficazes. Nem paliativos. O organismo afetado continuará no processo de debilitação, até a falência total dos órgãos, como ouço falar no jargão médico.

O que fazer, então? Não tenho autoridade nem dimensão para fornecer a resposta apropriada. Mas, tateando aqui e ali, buscando algo da experiência de mais de setenta anos de vida, ouso dizer que a providência mais urgente, inadiável mesmo, seria a completa substituição dos que hoje detêm o poder de mando. Assim penso para manter rigorosa coerência com o que acima esbocei: se são incompetentes, não vão superar esse defeito da noite para o dia, sendo inviável imaginar que, por um passe de mágica, se transmudarão nos administradores eficientes de que necessitamos.

Como fazer esse salto de qualidade? São outros quinhentos. E bote quinhentos nisso. O ideal seria que, tocados pelo clamor generalizado, pela grita incontida das massas, esses estafermos pura e simplesmente se afastassem do poder espontaneamente, com uma renúncia coletiva, a partir, é lógico, da incompetente maior. Seria, porém, pedir demais. Como teriam eles todos (ela, principalmente) sensibilidade suficiente para a prática de um gesto de grandeza? Para compreender, mesmo com sua inata incompetência, que já basta, que já cansamos e que é preciso rever os parâmetros e traçar novos rumos?

A hipótese definitivamente não é viável. Resta o caminho do impeachment. É traumático, dizem uns. Seria golpe, geme dona Dilma. Nem uma coisa nem outra. Se já não é possível prosseguir do mesmo jeito; se os responsáveis pela baderna não se tocam, o jeito é ir buscar na Constituição a receita definitiva. E é esse instituto (extremo, reconheço) que ela vai recomendar como medicação. Tomemo-la, antes que seja tarde demais. Pode ser que assim o meu futuro neto, de cuja vinda fui informado esta semana, não precise formular a mesma pergunta que eu não soube responder a contento. Torço por isso. Até porque, mesmo que eu consiga ir driblando a idade, fio que não estarei mais aqui para atender o pimpolho. Terei morrido de inanição. Ou de raiva, o que é pior.

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