Nos fins do século XIX e nos albores do que se lhe seguiu, os ingleses não tinham nenhuma restrição a Manaus, nem daqui sentiam medo. Tanto é assim que para cá vieram, aqui se estabeleceram e montaram acampamento, sem qualquer temor do sol equatorial, eis que usavam suas casimiras nada tropicais. Com a leniência de um governo de mente colonizada, deitaram e rolaram sobre nossas riquezas naturais, sugando-as tanto quanto lhes permitia a voracidade da sede imperialista, responsável primeira pela extinção do ciclo da borracha, com a transferência da semente nativa para as terras distantes da Malásia.

Agora, nos tempos modernos, talvez pelo relaxamento dos costumes, já não parece ser tão afoita e aguerrida a coragem inglesa. Pois não é que, diante da possibilidade (agora certeza) de disputar uma partida de futebol em gramado amazonense, o técnico da seleção daquele país teve um ataque agudo de diarreia mental e derramou uma série de tolices sobre a nossa cidade. Tivesse parado aí a tolice e já não seria suportável. Mas o pior é que parcela da imprensa londrina fez eco às sandices e passou a divulgar coisas estarrecedoras sobre Manaus, indicando-a como o pior lugar do mundo para viver… ou morrer.

Os ingleses têm medinho de cobras e jacarés e, de modo geral, de animais peçonhentos. Se não estou em equívoco, citaram como exemplo a tarântula, aranha que seria encontrada em qualquer esquina de Manaus e que, para terror dos britânicos, já estaria até sendo treinada para dizer “God save the queen”. Como nunca vi um animal desses, fui ao doutor Google e lá, na Wikipédia, fiquei sabendo que “pelo seu aspecto, as tarântulas ficaram famosas popularmente pela literatura e pela televisão, mas não são perigosas para os humanos. Não possuem veneno e são muito calmas. Para atacar, é preciso que elas se irritem muito, porém sua picada é muito dolorosa”. Ficam assim acalmados os sensíveis nervos ingleses e cada um deles pode até levar um exemplar, já que a tarântula pode ser criada em cativeiro.

Perigoso para as aranhas será se eles resolverem levar alguma delas a julgamento. Aline Pinheiro, correspondente do Consultor Jurídico – CONJUR, na Europa, informa que “o orçamento destinado à Justiça na Inglaterra deve sofrer novo corte no próximo ano e os juízes já alertaram: a redução dos gastos vai influenciar diretamente na qualidade da prestação dos serviços. Segundo um juiz, que prefere não ser identificado, o tribunal onde trabalha está caindo aos pedaços. Os aquecedores, fundamentais no gelado inverno inglês, não funcionam muito bem. No verão, não há ar condicionado e só alguns ventiladores tentam dar conta do recado. O elevador está quebrado e a falta de funcionários de apoio torna cada vez mais constante os atrasos nas audiências, já que os poucos assessores não conseguem organizar tudo para o julgamento começar na hora”. Talvez, por isso, a polícia londrina foi tão eficiente em matar covardemente Jean Charles de Menezes, numa estação de metrô.

Fico imaginando se um inglesinho desses, já apavorado com cobras e lagartos, for apresentado a uma das muitas personagens do nosso folclore. Na saída do Vivaldão, por exemplo, surge o Mapinguari. Vai ter gringo dando chilique, desmaiando e pedindo sais aromáticos. O gigante tem longas garras e uma pele semelhante à do jacaré. Ainda por cima tem uma coisa em comum com os ingleses que é a mania de evitar a água, daí porque “também possuiria um cheiro horrível, semelhante ao de um gambá”. É outro souvenir que eles podem levar para cultivar em suas charnecas.

Pior será se confrontarem a Matinta Perera. “Trata-se de uma velha que a noite se transforma em um pássaro agourento e, pousando sobe os muros e telhados das casas, se põe a assobiar e só para quando o morador, já muito enfurecido pelo estridente assobio, lhe promete algo (geralmente cigarro, mas pode ser também café, cachaça ou peixe). A Matinta, então para e voa, mas no dia seguinte a velha vem até a casa do morador perturbado para cobrar o combinado e, caso o prometido seja negado, uma desgraça acontece na casa do que fez a promessa não cumprida”. A velha, dizem, é extremamente feia. Entretanto, para diminuir o apavoramento dos visitantes, sugiro que lhe coloquemos uma coroa e um manto e a velhinha se transformará em alguém muito familiar e querida dos ingleses.

Resta a cobra grande. Aqui, cuido que um só espécime de boiúna será mais que suficiente para servir de assento a toda a rapaziada inglesa, acalmando-a com proficiência enquanto assiste ao jogo. Viajarão de volta, todos eles, lépidos e fagueiros, depois de terem conhecido uma verdadeira cobra amazonense, coisa que eles jamais verão nas brumas de seu fog.

Ora, deixem de frescura, ingleses. Venham, joguem, percam e “go home”, pois, do contrário, vão acabar todos beneficiários da bolsa idiotice, a ser criada especialmente para vocês. Era só o que me faltava!

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