Felix Valois

Este 2015 definitivamente não foi um ano bom. Acho que para todos os brasileiros que têm vergonha na cara, mas, no meu caso particular, cuido que ele pode entrar na categoria de “funesto”. Essa coisa cretina chamada morte me perseguiu desde o primeiro semestre. Foi quando vi partir Ivan de Azevedo Tribuzzy, meu velho colega de Colégio Estadual e de Banco do Brasil. Homem bom e matemático dos mais brilhantes, não tinha nada que nos deixar tão cedo. Logo depois foi a vez de Demósthenes Buzaglo que, se outras virtudes não possuísse (e as possuía aos montes), era marido dessa dama chamada Lourdes e pai de Rinaldo, o homem do violão, da bossa nova e da Malu. Lá se foi também Carlos Fausto Ventura Gonçalves, exemplo de retidão e ética no exercício da advocacia.

A segunda metade não foi menos ruim. Em agosto, João Bosco Simas Vieira empreende a viagem sem retorno, deixando viúvas a boemia e a seresta manauaras que, sem ele, perderam o brilho e murcharam. A seguir, Álvaro Gaia Nina embarca e não volta. Não é possível esquecer seu discurso coerente e vibrante, tendo sido ele, ao lado de José Paiva Filho, um dos responsáveis pela minha introdução nas coisas do marxismo. Por fim, a idiota da “inimiga das gentes”, no maior descaramento, sequestra definitivamente minha irmã caçula, transportando a Mimita para a “voluptuosidade do nada”, se me é permitido usar a expressão machadiana.

Se de morte não se tratou, nem por isso foi menos grave ou menos ruim. Falo da ofensa gratuita, rasteira e barata que um órgão de imprensa assacou contra a honra profissional do meu filho Luís Carlos. Aqui, pelo menos, consolou-nos a intensa e unânime solidariedade recebida, não só das associações e de membros da magistratura, mas de todas as partes, de todos os cantos, onde ainda está presente a certeza de que a honra ombreia com a vida e com a liberdade na hierarquia de direitos e, por isso mesmo, não pode ser alvo da leviandade e da ignorância.

Enquanto essas desgraças particulares me atingiam, ainda tinha eu que ver, juntamente com meus compatriotas, o completo aviltamento do Estado brasileiro, por foça da ação corrosiva, desleal e deletéria do grupo político que tomou o poder há mais de uma década. Dilma Roussef não se revelou só incompetente. Foi muito além disso: semeou a incerteza e o desencanto nos corações dos nativos desta grande terra, levando ao desespero milhões de pessoas que nada pediam além do direito de trabalhar honestamente e viver, também honestamente, com o produto desse trabalho. Porque a tão falada crise, se provém de intrincadas equações econômicas internacionais, não teria por si só o condão de fazer proliferar a desonestidade, disseminando-a prodigamente e fazendo com que as instituições mais caras à democracia fossem abaladas nos seus alicerces. Claro que não. Para tanto foi indispensável a atuação de um governo mambembe, contraditório com a teoria e a prática e, o que é talvez mais importante, absolutamente descompromissado com os valores da ética e da probidade.

A tanto chegamos. A sucessão de escândalos financeiros é um tapa que recebemos na face diuturnamente. O presidente do Senado da República é alvo de investigação criminal, a partir do Supremo Tribunal Federal. O presidente da Câmara dos Deputados, quarto na linha de sucessão presidencial, tem suas casas e escritórios vasculhados pela polícia, à cata de provas que possam vir confirmar aquilo de que todo mundo pelo menos desconfia: ele não chegou a esse ponto por ostentar as virtudes de um varão de Plutarco.

É o lamaçal puro e simples, espraiando-se pelo organismo nacional, assim como fisicamente ocorreu na tragédia de Mariana, que soterrou famílias e destruiu vidas. No plano político também estamos soterrados pela corrupção e nossas vidas já não valem um grama de mel coado, por isso que respirar está difícil e sobreviver passou a ser um ato que beira o heroísmo.

O pior é que, à guisa de combate a esse caos, ainda somos obrigados a conviver com o mais completo desrespeito a princípios elementares do direito, num quadro em que tem inteira aplicação o postulado fascista de que “os fins justificam os meios”. As chamadas “delações premiadas” são a moeda de troca da ordem do dia, traduzindo-se na elevação da alcaguetagem à categoria de virtude. E o próprio Supremo Tribunal Federal, indiscutível guardião da ordem constitucional, embarca nesse vapor de insanidade e ordena a prisão de um senador, em pleno exercício do mandato, numa conduta que qualquer estudante de direito, por medíocre que seja, saberá apontar como desnecessária, ilegal e nitidamente corporativista.

É. Não foi um bom ano. Que ele termine logo, antes de que o governo consiga o feito olímpico de fazê-lo ainda pior. É difícil. Mas tudo se pode esperar de uma senhora que confunde dentifrício com tudo de pasta e que, num arroubo de futurismo científico, já propôs que nos dediquemos à dignificante atividade de estocar ventos. Nada se duvide dos insanos.

P. S. – Estarei ausente nas próximas semanas. Aos que se dão à pachorra de me ler, desejo que consigam receber algum presente do Papai Noel. E que o próximo ano venha sem Dilma e sem Lula. Não digo sem Temer, porque alguém tem fechar a porta.

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