Ninguém sabe ao certo quando ou de onde aquele homem surgiu, como se tivesse brotado da própria terra, entre raízes antigas e sombras dançantes da Floresta Amazônica. Seu olhar carregava o mistério das águas profundas e sua voz, ao ser ouvida, fluía como um rio sereno, refrescando almas sedentas de consolo. Sabe-se apenas que todos recorrem a ele, atraídos por algo inexplicável, como se suas palavras fossem um bálsamo invisível, capaz de curar as dores mais ocultas, de guiar os perdidos e de despertar nos corações a chama esquecida da esperança.

— “Para quem sabe viver sem guardar ódio no coração, a vida e a morte são apenas dois lados de uma mesma moeda”, ensinava. Aquele homem parecia entrar em transe quando aconselhava: — “É impossível ser livre quando há prisões por todos os lados”, repetia. E, depois de um breve silêncio, prosseguia com sua voz serena: — “Mas a pior prisão não é aquela feita de muros e grades, e sim aquela que construímos dentro de nós mesmos. A mente acorrentada pelo medo, pelo ego e pelo apego aos bens materiais e quem segue esses valores jamais conhecerá a verdadeira liberdade”.

Ele ergueu os olhos para o céu e continuou: — “Muitos acreditam que a liberdade é fazer o que se deseja, mas poucos percebem que ser verdadeiramente livre é não ser escravo dos próprios desejos. O homem que busca a felicidade no poder, no controle ou na aprovação alheia apenas troca de cárcere sem jamais encontrar saída”. Com um leve sorriso, concluiu: — “A única liberdade real nasce no instante em que compreendemos que nada nos pertence e que o fluxo da existência não pode ser aprisionado. Quando aceitamos isso, não há mais correntes, apenas liberdade”.

Depois de proferir sábias palavras para o povo, aquele Homem, assumindo aspecto angelical, convidou a todos os presentes para um momento de louvor, entoando cantos antropológicos: — “Ó Mãe Natureza, conceda-me a graça, de viver o tempo presente, porque só o agora importa, porque sou raiz, sou vento, sou chama que não se apaga. Minha alma é floresta, meu canto é de paz e de liberdade. Nada possuo, tudo flui. Sou livre no corpo, sou leve no espírito, sou silêncio que dança, na voz da Mãe Natureza” — e todos repetiam em uníssona voz.

As vozes se entrelaçavam como o vento dançando entre as árvores, criando uma melodia ancestral que parecia despertar algo adormecido no coração de cada um dos presentes. Os olhos se fechavam, os corpos se embalavam suavemente, e por um breve instante, não havia passado nem futuro apenas o agora, pulsando no ritmo dos mantras da floresta. Era como se, naquele círculo sagrado, a própria Mãe Natureza respondesse, sussurrando sua presença no farfalhar das folhas e no brilho das estrelas. — “A minha filosofia é aquela que ensina que você pode alcançar tudo o que deseja, para isso basta harmonizar: Corpo, Mente e Espírito”, ensinava.

Uma voz se fez ouviu: — “Quem é você?” “Conte-nos sua história de vida?” “Como veio parar aqui?”. — “Eu sou aquele que vos fala”. E continuou: — “A muralha que separa a saúde do corpo e a doença da mente está no pensamento de querer ser melhor que o outro. Enquanto houver a ilusão da superioridade, haverá sofrimento, pois a verdadeira grandeza não está em superar o próximo, mas em compreender que cada ser tem sua luz e sua jornada”.

Ele continuou ensinando, mas dessa vez com voz firme e atroadora, dizendo: — “Ninguém é melhor do que ninguém. Ninguém é pior do que ninguém. Somos iguais na essência. Somos diferentes na caminhada. Somos irmãos na eternidade do existir. E quando entendermos isso, as muralhas cairão, a mente será livre e o espírito encontrará a paz”.

Aquele Homem falava como se cada palavra fosse um sopro de eternidade, um eco vindo de tempos imemoriais. Mas, apesar da insistência de muitos moradores do povoado em quererem saber sua origem, ele nunca falava sobre sua vida pessoal e nem explicava de onde vinham seus ensinamentos, nem quem lhe havia confiado tais verdades. Apenas sorria, como se soubesse que certas respostas só podem ser encontradas no silêncio.

Certa vez, alguém lhe perguntou qual era o sentido último da vida. Ele olhou para o céu, desenhou um círculo no chão e respondeu: — “O começo e o fim são ilusões criadas pela mente. O que existe, de fato, é o fluxo. Quem tenta segurá-lo, sofre. Quem aprende a fluir, descobre a paz”.

E numa noite de lua cheia, aquele homem partiu sem deixar rastros, como um vento que vem e vai sem aviso. Mas suas palavras ficaram, vibrando nos corações como um mantra eterno, repetido nos momentos de dúvida, de esperança e de renovação para aquele povo.

Luís Lemos é professor, filósofo, escritor, autor, entre outras obras de, “O primeiro olhar” (2011), “O homem religioso” (2016), “Jesus e Ajuricaba na terra das amazonas” (2019), “Filhos da quarentena (2021) e “Amores que transformam” (2024).

Instagram: @luislemosescrito

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