Felix Valois

O Brasil está claramente dividido em duas facções que se posicionam ao lado de Dilma e contra ela. Há de haver os abúlicos, aqueles que imaginam ser coisa do outro mundo adotar uma postura política, seja ela qual for, com receio, talvez de contaminar a pureza de pensamentos que, a partir daí, nem podem chegar a tal categoria. É natural que a bipolarização tenha ocorrido. Os governos do PT se esforçaram para consegui-la, na medida em que lograram descumprir desde fundamentos programáticos até triviais promessas de campanha, deixando o povo na dependência de um paternalismo criminoso e insustentável. Já dá para ver em que facção me posiciono, o que, aliás, nunca foi segredo, pois nunca fui de ocultar o que penso através de tergiversações. O que interessa abordar, entretanto, não é esse ponto específico, mas sim o degradante espetáculo que, por vezes, tem sido encenado pelos dois lados em conflito.

Relembremos o que se passou na última semana. Sem nenhuma necessidade, absolutamente nenhuma, o juiz Sérgio Moro determinou a condução coercitiva de Lula, acredito que para prestar esclarecimentos. Estava montado o circo. A Polícia Federal e as televisões, estas comandadas pela Globo, se encarregaram do resto e propiciaram imagens e assuntos que tomaram conta do país por longo espaço de tempo. No fundo, mais um camuflado desrespeito a princípios garantistas que estão insculpidos na Constituição da República. Não é assim que deve ser e não vou me cansar de repetir: não existe causa que possa justificar um arranhão sequer nas normas constitucionais, porque uma República em que não se respeita a própria Constituição pode ser a República de Costa e Silva, Médici, Pinochet e Bolsonaro, mas não é a República pela qual lutamos ao longo de mais de duas décadas de ditadura militar. Não é a República que amo e venero com emoção, ao contemplar o “auriverde pendão da minha terra”.

A consequência dessa tolice foi imediata. Lula agarrou com unhas e dentes o palanque tão gentilmente proporcionado e iniciou o que para qualquer retardado ficou caracterizado como início da campanha presidencial para 2018. Ocorre, porém, que, como toda causa só pode gerar o efeito que lhe é correspondente, se o palanque foi ofertado por uma sandice, o uso dele não se afastou desse parâmetro. Destilando ódio, o ex-presidente insistiu em vestir a carapuça de vítima indefesa e injustiçada, desenvolvendo uma atabalhoada argumentação em que a tônica foi a retórica da dicotomia “elites” contra “pobres”, como se isso pudesse justificar os desmandos a que se entregaram ele, sua sucessora e seu partido.

Explicação mesmo sobre os fatos que o levaram à situação de hoje, Lula não deu nenhuma. Perdeu-se num vazio de divagações sem nexo, com uma linguagem chula e ofensiva ao vernáculo, cujo ponto alto, a essência, talvez a única verdade do aranzel foi a autoqualificação como “este merda deste metalúrgico”. Isso foi de tocante sinceridade e tive que aplaudir de pé. Concordo em gênero, número e grau.

Agora, passado esse momento inicial de acirramento do conflito, programa-se manifestação pública para o próximo domingo, dia 13. Legítimo, indiscutivelmente legítimo, por isso que externar opinião faz parte do jogo democrático, como não escaparia ao Conselheiro Acácio. Mas eis senão quando, para manter o toque de insensatez que marcou a tal condução coercitiva e o subsequente discurso, chega ao meu celular, por meio do zapzap, um texto apócrifo, contendo “regras para a marcha”, depois da advertência de que “queremos que tudo transcorra de forma ordeira e pacífica”.

Os (suponho que o sejam) “organizadores” esclarecem qual “a pauta do movimento”, estabelecendo que ela se baseará em cinco itens. Os três primeiros, pela ordem do enunciado, são: “fora Dilma”, “vai ter impeachment sim” e “prendam Lula”. Que o inicial se realize, desejo com o mais ardente fervor, já que não me é mais possível suportar essa despreparada senhora a dizer besteira na televisão e agir como se o país fosse propriedade dela. O segundo, estreitamente vinculado ao primeiro, sendo dele seu pressuposto, já não é assim tão fácil, conhecido o Congresso que temos. O terceiro é pura tolice, pois a prisão de qualquer cidadão, mesmo do Lula, há de ser feita dentro de rigorosos parâmetros legais e não pelo clamor público.

No quarto item da pauta a coisa se complica. Está escrito: “só queremos Polícia Federal e Ministério Público”. T’esconjuro! O que diabos viria a ser isso? Culto à personalidade não pode ser, uma vez que se trata de instituições. Amor profundo pela PF e pelo MP? Se é isso, é patológico. Quem achar conveniente pode querer só isso. Eu, de minha modesta parte e como diria minha neta Luciana, “estou fora” de anseio tão fervoroso. Quero mais: quero o Brasil de volta.

O item final só pode ser gozação. É ele: “somos todos MORO”, assim mesmo em caixa alta. Só posso exclamar como bom amazonense: ÉGUA! Por que cargas d’água eu tenho que ser Moro ou lá quem seja que se tenha atribuído o ferrete de salvador da Pátria? Não sou Moro nem moroso, sou Caprichoso. Sou brasileiro, orgulhoso do meu país, continuando na luta por uma sociedade justa e igualitária. Se o doutor Moro reza por essa cartilha, melhor. Mas eu me recuso a acionar o holofote que, aí sim, o culto à personalidade sempre exigiu.

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